O mercado só é global para os outros. Produzimos essencialmente para consumo interno, pedinchando que se consuma português, ou então para outros venderem. Olhamos com justificado orgulho para o mercado do calçado, mas do produto de luxo que é produzido, em média, apenas 25 euros ficam em Portugal. Como o calçado bem ilustra, a qualidade do produto não está em causa, somos é incapazes de o valorizar nós próprios. Uma fraca vocação comercial que já vem de trás: nem no fulgor das expansões soubemos incutir nas colónias um imperialismo económico à inglesa, como Jaime Nogueira Pinto lembrou recentemente numa entrevista à SIC. Não é por nada que a Forbes coloca Portugal entre os vinte melhores países do mundo para fazer negócios. É só chegar cá e tomar como seu os nossos produtos.
Na raiz do problema, três fatores se conjugam: uma falta de crença no valor, algum desconhecimento do que é isso de valorizar um produto, e a pouca propensão humana para ouvir terceiros. Um conhecido meu disse-me no outro dia em jeito de provocação “mas quem é que precisa de um planeador estratégico? Boa tarde bom senhor queria sff um planeamento estratégico.” E tem razão, custa pagar por uma opinião, mesmo a um especialista. Falta o concreto, o palpável, o retorno físico do dinheiro pago. Paga-se mais por uma fotografia do que por uma campanha publicitária. Recorre-se a um designer que faça um logotipo para uma nova marca mas não a um consultor que desenhe as linhas mestras de um posicionamento. E contudo, sem insight estratégico o palpável perde sua razão de ser, é ferido na sua relevância até se confundir com o comum. Desaproveita-se o seu potencial de valor, com implicações na produtividade nacional, e resvala-se o produto para questões de preço jurando a pés juntos que é de primeiríssima qualidade.
Toda a especificidade do que fazemos por cá e o modo como o fazemos tem mercado lá fora, não é preciso ser português para se gostar do que fazemos. Mas é preciso ser português para o ter criado. O famoso desenrascanço português não é mais do que um sintoma da nossa original capacidade de pensar fora da caixa. Também por isso se note talvez tanto improviso na hora de embalar. Aproveite-se esse poder de iniciativa nesta hora de aperto. Criemos as nossas próprias marcas, agora com pés e cabeça.