O lado sexy dos seniores

O lado sexy dos senioresOs consumidores seniores têm um lado sexy. As marcas e a publicidade é que ainda não o conhecem. Faltam-lhes dados e esse é o objetivo de um projeto que une o 40+Lab, a APAN e a GfK. O tema esteve em foco no seminário “Experience for life”, promovido pelo IPAM. Ao Briefing, a CEO da consultora especializada, Ana Sepúlveda, fala sobre os preconceitos que ainda envolvem estes consumidores.

Briefing | O 40+Lab é especializado em consumidores seniores. Já somos seniores aos 40?

Ana Sepúlveda | Segundo a Organização Mundial de Saúde, a idade sénior começa aos 65 anos. Da nossa investigação, de facto a idade que marca as pessoas como sendo aquela em que efetivamente sentem que estão a ficar velhas é também por volta dos 65 anos. Isto para dizer que alinhamos com a convenção da senioridade etária aos 65 anos. Contudo, e em termos de gestão e marketing, em termos de desenvolvimento de negócio e de desenvolvimento das sociedades, este trabalho de compreensão dos diferentes tipos de senioridade tem de começar mais cedo, por volta dos 40 anos.

A razão de ser prende-se com um conjunto de processos internos aos seres humanos, que ocorrem por volta dos 40-45 anos, que resultam num rever da vida e no início ativo de preparação da velhice. São processos neuro-cognitivos, que muitas vezes são reforçados por fatores externos, como a alteração da condição face ao trabalho, por exemplo, empurram o indivíduo para um repensar da sua vida. Este repensar altera todo o estilo de vida e no fim da cadeia, o consumo e a relação das pessoas com as marcas.

Obviamente que a intensidade do processo varia de pessoa para pessoa. Algumas passam por tudo isto de uma forma tranquila e sem grandes roturas, outras fazem mudanças radicais na vida, incluindo alterações na vida familiar e afetiva.

Por isso, na 40+Lab assumimos, sem sombra de dúvida, que se é sénior por volta dos 65 anos, mas a razão de ser do nosso nome tem a ver com o facto de fazer muito pouco sentido olhar para os seniores sem olhar para os adultos na sua fase mais significativa de preparação da velhice. É algo que faz todo o sentido e é mesmo estratégico quando se trabalha o segmento sénior e que normalmente não faz sentido quando se trabalham os outros segmentos etários.

Briefing | O que define o consumidor sénior? É só um ou há vários tipos?

AS | Tal como nos outros segmentos etários de consumo é complicado olhar para as pessoas e pensar que são um grupo homogéneo, o mesmo se passa com os seniores.

Existem algumas características comuns à condição de se ser sénior e que marcam o consumo, mas de todo, não se pode falar no consumidor sénior, como se este grupo fosse um só grande grupo, com motivações e necessidades semelhantes.

A 40+Lab está a desenvolver um projeto em conjunto com a APAN e a GfK, que segmenta as pessoas entre os 45 e os 75 anos, de acordo com as suas grandes motivações ou estratégias para lidar com a senioridade.

Uma segmentação complexa e inspirada num projeto em que estive envolvida em 2008 e que assenta a sua pertinência no facto de não fazer sentido segmentar estas pessoas por idade e/ou pela condição face ao trabalho, numa clivagem simplista entre reformado e não reformado. Até porque aquele que está oficialmente reformado pode estar ativo em termos de trabalho. Tudo isto para dizer que existem diferentes tipos de consumidores sénior.

Briefing | O que o caracteriza face ao consumo?

AS | Como referi, é complicado responder a esta questão como se todos os seniores respondessem da mesma maneira, ou se comportassem da mesma forma face ao consumo, mas também como disse, temos alguns traços gerais e comuns.

Tal como as demais pessoas na sociedade, as pessoas mais velhas gostam de consumir, é importante ter isso em mente. O consumo para todos nós é muito mais do que comprar um produto ou serviço. Há toda uma carga simbólica e emocional envolvida.

Neste caso, consumir é uma forma de sentir que ainda se faz parte da sociedade, que ainda se está, de alguma forma, ativo economicamente falando.

Há uma visão muito estereotipada em relação aos seniores e isto vê-se na oferta de consumo, muitas vezes assente em questões funcionais e que muitas vezes reforçam o lado mais frágil da velhice. Isto por um lado.

Por outro, temos ainda uma visão que nivela por baixo, em termos de disponibilidade económica, as pessoas mais velhas, o que resulta numa oferta de consumo mais interessante para as camadas sociais mais baixas, em detrimento daquelas que, embora sejam percentualmente mais pequenas, são financeiramente mais interessantes.

Por tudo isto, mais do que dizer o que os caracteriza face ao consumo, é mais importante dizer como se sentem face ao consumo. São pessoas discriminadas e alvo da falta de conhecimento que as empresas têm sobre elas. São pessoas que muitas vezes sentem que não há oferta para as suas necessidades ou motivações de compra e isto é preocupante.

São pessoas que, porque têm uma certa idade, deixam de poder ter acesso a determinado tipo de serviços, o que para elas não faz sentido e as revolta.

O serem tratadas de uma forma preconceituosa e que as exclui faz com que não se revejam na oferta de consumo.

Briefing | De que modo constitui um desafio para as marcas?

AS | O grande desafio para as marcas não está tanto nestas pessoas. Está mais na forma como elas são vistas. São vistas como pouco sexy e interessantes, são vistas com uma carga emocional negativa muito grande e são alvo de um conjunto de estereótipos que, em muitos dos casos, dificulta o trabalho interno, das marcas, de pensar na melhor forma para integrar este segmento de consumo no seu leque de consumidores.

Nós, na 40+Lab, desenvolvemos uma oferta, na nossa área de formação, que visa munir as equipas de gestão e de marketing de ferramentas que lhes permitam combater estes muros internos que excluem o consumidor sénior e olhar para estas pessoas como elas são e identificar o potencial de negócio que existe. É um desafio de mudança de paradigma e de mentalidade.

São um desafio porque são um fenómeno novo na sociedade e são vistos como um segmento socialmente não desejável, na cabeça de muitas pessoas. É importante não esquecer que há uma corrente de pensamento que atribui parte da crise do nosso sistema social ao peso dos velhos na sociedade.

Briefing | Diria que as marcas têm sabido aproveitar este segmento dos consumidores?

AS | Algumas marcas sim. Quando os tratam como adultos e como pessoas normais, não os ridicularizam, sim. Estas marcas, que olham para as pessoas mais velhas sem preconceitos, como elas efetivamente são, ou aquelas que se posicionam ao lado das pessoas entre os 40 e os 50 anos como sendo pertinentes para as suas vidas, essas têm lugar praticamente garantido no leque de marcas da vida que passam a fazer parte da vida dos seniores.

As outras obviamente que não. Como disse, esta cara da demografia portuguesa é nova e estamos a aprender a lidar com ela, em todos os setores da sociedade e a todos os níveis: nacional, ao nível da União Europeia e mesmo mundial. As marcas vão aprendendo e vão sabendo tirar proveito deste segmento. Por sabermos que há este espaço para a aprendizagem que nós existimos. O nosso foco no consumidor sénior, ou se preferir, na pessoa sénior, é fruto desta novidade que vivemos.

Briefing | E a publicidade como o tem tratado? Não é um consumidor sexy para comunicar…

AS | A publicidade me muitos casos não sabe lidar com ele. E não é fácil. Naquelas situações mais funcionais, onde o produto é claramente para uma pessoa sénior, o trabalho está um pouco mais facilitado. Falo de produtos como aparelhos auditivos, por exemplo. Mas mesmo neste caso é importante ter cuidado para não entrar num discurso que os ridiculariza.

Noutros casos, onde se quer dar a entender que o produto, ou serviço, é para uma pessoa sénior, mas sem o referir, é mais complicado.

O mais difícil nem é o facto de não ser um segmento sexy. É um segmento sexy mas os contornos deste “sexy” são diferentes daqueles com que estamos habituados a lidar.

É mais fácil trabalhar uma campanha para jovens que para seniores ou mesmo adultos em determinadas idades. Muitas vezes porque as próprias equipas criativas não possuem material para isso.

Mais uma vez volto à questão da forma como estas pessoas são vistas e à existência de dados qualitativos sobre estas pessoas. Se eu tenho uma visão negativa relativamente a uma pessoa, com muita dificuldade farei uma campanha positiva, faltam-me dados, falta-me uma fonte de inspiração.

É isto que o projeto que estamos a fazer com a APAN e com a GfK pretende trazer ao mercado, a par do que já referi sobre a segmentação motivacional. Pretendemos que este projeto seja uma boa fonte de conhecimento e inspiração para quem trabalha a publicidade, para que conheça o lado sexy dos seniores.

fs@briefing.pt

Quinta-feira, 12 Junho 2014 11:57


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