Quem deixamos que nos censure

Diogo Queiroz de Andrade, Consultor de Media, Produtor de Conteúdos e Jornalista A Google e o Facebook decidem efetivamente a informação que é consumida. Quem os elegeu como censores? Nós.

A execução pública do jornalista James Foley, produzida como peça de propaganda e de demonstração de poder dos radicais do IS, foi banida das maiores redes sociais. Facebook, Youtube e Twitter retiraram os acessos ao vídeo das suas plataformas. O valor da decisão não está na morte de um humano, nem na violência explícita dessa morte. A decisão é puramente ideológica — e é aí que tudo se torna perigoso. Porque é que o assassínio de Foley merece ser censurado mas a imagem de uma criança assassinada em Gaza é legítimo? Ou as fotos da tortura em Abu Ghraib? Ou as imagens dos corpos dos passageiros do MH17?

A questão de fundo não é o racional que motiva cada decisão, é quem queremos que tome essa decisão. Quem nos deve poder censurar, tendo em conta que banir um determinado conteúdo de uma rede como o Facebook equivale a retirá-lo da vista de muitos milhões no mundo todo? O Facebook tem quase 1.5 mil milhões de utilizadores, o Youtube apanha uma em cada duas pessoas ligadas à net. Na maior rede social, por exemplo, há sérias restrições quanto à nudez parcial — e isso implica fortes restrições a fotos de mães a dar de mamar, o que é um moralismo bastante idiota.

A forma de olhar para este problema diz muito sobre como entendemos a internet. O que está em causa é perceber qual é o papel das entidades que dominam, na prática, o espectro das comunicações digitais — a começar pelos gigantes Google e Facebook. São empresas privadas de mérito próprio, que servem muitos milhões pelo mundo fora. Mas o facto de trabalharem em cima da internet e de usarem conteúdos alheios faz deles uma plataforma, uma publicação ou outra coisa qualquer?
Mais importante ainda, o que é a internet? É espaço concessionado como o serviço telefónico, onde as empresas que nele operam estão impedidas de tomar posição sobre a forma como é usado e o tipo de discurso utilizado? Ou é a internet como o espaço televisivo, concessionado em função de restrições sobre o que pode e não pode ser emitido?

Em qualquer dos casos, faz pouco sentido que quem decide a informação que grande parte da humanidade consome sejam uns senhores de Silicon Valley que gostam de ir passear fins-de-semana radicais no Burning Man…

 

Segunda-feira, 25 Agosto 2014 11:49


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