Qualquer semelhança com a realidade não é pura coincidência

Vivemos uma situação estranha que insiste em lembrar-nos alguns momentos do “Ensaio sobre a Cegueira” ou do filme “Contagion”, em versão espanhola, e, tal como nessas obras de ficção, temos visto como a sociedade tem reagido à crise sanitária.

 

 As pessoas e as marcas são capazes de grandes gestos de entreajuda social.

Algo de bom que este vírus nos trouxe foi o de começar de novo a desenvolver um espirito de comunidade que tínhamos esquecido.

Por outro lado, vemos exemplos menos bons. Vemos como os “heróis” dos hospitais que aplaudimos diariamente às 20h são agora, num momento pós-pico de contágio, menos necessários e, como tal, um bocadinho menos “heróis” do que eram há umas semanas, sendo em muitos casos despedidos, sem escrúpulos.

 À espera do final feliz.

 As pessoas esperam ansiosamente esse final feliz que estamos habituados a ver no final de cada história…um final que pode não ser como um final real e contundente de um filme de longa metragem, mas, sim, um simples final de temporada de uma série que nunca mais acaba.

Um desconfinamento precipitado pode fazer com que voltemos à quarentena. Um cenário mais do que péssimo para a economia e para a moral social.

 Um pouco de fé e erotismo sempre ajudam.

Voltamos agora a ser mais crentes e a ver mais TV. As audiências de missas superam por muito a dos telejornais diários. Em momentos como este é sempre bom ter Deus do nosso lado e um pouco de erotismo também.

Num universo de 2500 espanhóis, 71% afirmou ter experimentado pela primeira vez algum jogo erótico online durante estes dias.

(“Post Pandemic Report”. Sra. Rushmore. Fontes: Google Trends & Sex Place)

O raio de luz de um possível final feliz é visível nas compras online. Se há dois meses os artigos que mais consumíamos eram de alimentação e bebidas, conteúdos online e de desporto indoors… o que mais se vende agora continuam a ser os artigos de desporto, mas outdoors.

Saímos organizadamente da quarentena total para dar passeios e fazer running. Sonhamos com as praias, os passeios pela montanha e os bares… uma Espanha sem bares é inconcebível, assim como uma Espanha aonde as pessoas não fazem a sua vida social nas ruas…Impensável!

As paredes têm olhos e ouvidos.

Vemos como grandes marcas tecnológicas e de operadores fazem o possível para que o governo controle os nossos movimentos através dos nossos telemóveis. E, brevemente, também as nossas relações através de uma app.

Algo impensável numa democracia moderna há três meses. Passamos de um Big Brand is watching you para um Big Brother is watching you para bem da saúde pública e assim conseguirmos acabar com o vírus vilão e fazer com que esse tão esperado final um dia finalmente chegue.

Um final que todos esperamos que possa ser feliz, com um beijo de verdade sem máscaras cirúrgicas e um “The End” com intermináveis créditos, onde todos os nossos nomes de cívicos protagonistas aparecem, ou simplesmente acabar, como aqui acabam todos os contos felizes: “Colorín colorado, este cuento se ha acabado”.

 

Quito Leal, diretor criativo freelancer a viver e trabalhar em Espanha

 

briefing@briefing.pt

Terça-feira, 26 Maio 2020 08:33


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