Da COP28 esperava-se que fosse a cimeira dos compromissos, financiamentos e sinais políticos fortes alinhados com a urgência da crise climática – e foi, sem dúvida, uma cimeira sem precedentes. Não só pela sua dimensão, mas sobretudo por um sinal crucial: a decisão de abandonar os combustíveis fósseis com o objetivo de limitar o aquecimento a 1,5°C.
Foram necessárias três décadas de negociações para que fosse reconhecido o peso dos combustíveis fósseis na crise climática, algo que resultou da mobilização em massa da sociedade civil em todo o mundo. Esta decisão de transitar para o abandono dos combustíveis fósseis está muito próxima de uma eliminação progressiva, mas não inclui consenso sobre a eliminação total do carvão, do petróleo e do gás. Isto significa que o caminho para a eliminação dos combustíveis fósseis é ainda longo e com muitos lobbies pela frente.
Outra das expectativas para a COP28 era que os países reconhecessem que a crise climática e a crise da biodiversidade estão ligadas. Os sistemas naturais estão a ser empurrados para além dos seus limites, pelo que a descarbonização e o restauro da natureza têm de acontecer em paralelo. Um dos avanços que se verificou na cimeira foi o apelo ao fim da desflorestação e da degradação florestal até 2030 e o reconhecimento de salvaguardas alinhadas com o Quadro Mundial para a Biodiversidade.
Foram ainda feitos avanços na operacionalização do Fundo de Perdas e Danos, abrindo caminho a promessas financeiras que totalizam mais de 700 milhões de dólares. Mas esta operacionalização depende também de fundos que, até agora, tardam em chegar. É preciso um investimento claro para que o Fundo seja realmente efetivo, na medida em que as pessoas e a natureza nos países mais vulneráveis, a maioria dos quais pouco contribuiu para causar o problema, são os mais lesados pelos efeitos das alterações climáticas.
Espera-se agora que as decisões da COP28 se reflitam na legislação portuguesa e sejam acompanhadas por um planeamento e implementação adequados e transversais, com o envolvimento de todos os ministérios. As decisões internacionais não têm significado se não forem apoiadas por políticas nacionais transformadoras que mitiguem as emissões e promovam uma transição para as renováveis que não comprometa os valores da biodiversidade, e sim que os proteja.
2024 deve iniciar um ciclo de esperança para a natureza e para a biodiversidade. Durante o ano devem ser tomadas, sem hesitações, um conjunto de decisões que garantam uma natureza positiva para todos. É preciso agir já por um futuro sustentável para a vida selvagem, os ecossistemas terrestres, fluviais e marinhos e, sobretudo, para as pessoas. Só com uma natureza próspera podemos prosperar em termos económicos e sociais.
Ângela Morgado, diretora-executiva da ANP|WWF