Considerações filosóficas à parte e desconsiderando o impacto devastador que o atual modelo de produção, distribuição, consumo e gestão de resíduos tem na nossa sociedade, sobretudo nos recursos ecológicos, todos temos que comer pelo menos três refeições por dia. Assim sendo, e considerando a sociedade de informação em que vivemos, em que cada vez mais se compreende o impacto das decisões individuais, coletivas e políticas, no dia a dia dos cidadãos, das famílias e das empresas, importa relevar o papel positivo do crescimento do setor plant based.
Se bem que veganismo é bem mais que a recusa em consumir produtos de origem animal, estando relacionado, de modo mais holístico, com a não exploração de animais em vários outros domínios, o princípio da não violência e a crescente urgência de transitarmos para modelos mais éticos e regenerativos de existência, tem estimulado milhões de pessoas a reduzir o consumo de proteínas animais. O crescimento dos flexitarianos (reduzem o consumo de proteína animal), dos pescetarianos (apenas consomem proteína animal de produtos piscícolas), dos ovolactovegetarianos (não consomem proteína animal sem ser ovos, lacticínios e seus derivados), mas, sobretudo, dos veganos (sem qualquer consumo de proteína animal), demonstra que há um forte setor a emergir. E, se, antes, poder-se-ia dizer que era uma moda, hoje constata-se que é um estilo de vida que veio para ficar.
Se olharmos para a política europeia, nomeadamente depois da quebra das cadeias de distribuição com a pandemia da Covid-19, mas, sobretudo, agora, com o aumento generalizado dos preços alimentares decorrente da invasão da Federação Russa na Ucrânia (pese embora a Crimeia já tivesse sido ilegalmente anexada em 2014), verificamos que existe uma forte vontade política em garantir mais e melhor soberania dentro da União Europeia (UE). Esta visão é também, naturalmente, tida no ramo do agroalimentar, com a publicação da Estratégia do Prado ao Prato. Esta indica, entre outros pontos, a importância de produzir em modo mais extensivo, regenerativo e biológico, de garantir mais diversidade de consumo proteico, de diminuir o consumo de proteínas animais, de apostar no encurtamento das cadeias de produção, distribuição e consumo, de combater o desperdício alimentar, etc. Esta estratégia, sob a alçada do Pacto Ecológico Europeu, define também a importância de diminuir a pegada ecológica e carbónica do setor agroalimentar, que será impossível de alcançar se efetivamente não mudarmos o atual sistema agroalimentar. E se bem que tenho muitas críticas, sobretudo nos fundos da Política Agrícola Comum e do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura, que financiam práticas lesivas para a saúde pública, mas também para a regeneração da biodiversidade, tal como mantêm sistemas de produção e extração agroalimentares pouco éticos, existe uma mudança de fundo acontecer na sociedade.
Neste sentido, também o setor industrial produtivo, de distribuição e de retalho têm seguido esta tendência. Como exemplo, o setor da aquicultura, baseado nas algas, é um mercado emergente que tem cada vez mais espaço nas prateleiras das superfícies comerciais. E se a maioria destes produtos é importada de países terceiros, mais de 95%, a tendência é de decrescimento com o fortalecimento desta indústria na UE. Como outro exemplo temos a primeira produção de quinoa em Portugal (marca Quinoa Portuguesa), que se encontra em várias superfícies comerciais e que já faz parte de muitos menus no setor da restauração nacional. Mais, se olharmos para as superfícies comerciais vemos também um crescimento de produtos à base de plantas, seja em processados (hambúrgueres, salsichas, “queijos”, “leites”, etc..), seja no setor das leguminosas, dos hortícolas, dos frutícolas, das oleaginosas.
Este crescimento tem sido alimentado por uma procura cada vez maior, mas também por pequenos, mas importantes passos, dados nos Estados membros através de medidas fiscais em determinados bens alimentares, reduzindo o seu IVA por exemplo, mas também por se promover, através de marketing e publicidade, o seu consumo. Mas, verdade seja dita que ainda não existe o mesmo tratamento fiscal e económico desta fileira, bastante diversa e multifacetada de produtos, bens e serviços, como acontece na já estabelecida para produtos de proteína animal.
Para percebermos a importância deste setor, mesmo mantendo os atuais esquemas de financiamento, políticas fiscais, apoios industriais, marketing e publicidade, o setor plant based terá na UE um crescimento de 10%, entre 2022 e 2029, atingindo um volume de negócios de 16,7 mil milhões de euros em 2029, segundo o estudo “Europe Plant-based Food Market – Forecast for 2029”, feito pela Meticulous Research. A nível mundial estamos a falar de projeções para 2025, segundo dados da Statista, que podem atingir 77,8 mil milhões de dólares (73,2 mil milhões de euros).
A procura, a oferta, mas, sobretudo, as visões políticas neste segmento ditarão o ritmo do crescimento deste setor nos próximos anos. Porém, parece evidente que esta tendência passará a ser norma.
Francisco Guerreiro, eurodeputado independente