À euforia de unicórnios que nasciam na comunicação social em 2021, juntavam-se os alarmes da bolha, das hipervalorizações e do receio sobre o que poderia acontecer num mundo pós-pandémico. E, nesta altura, nem sequer se falava em guerra. Ninguém sabia o que estava por vir.
No último capítulo do meu livro (“Unicórnios Portugueses – a história das startups de mil milhões de dólares”, editado pela Lua de Papel), escrevo sobre isso mesmo: Seriam os recordes de 2021 assim tão boas notícias? Os alarmes entre analistas e especialistas fariam sentido? Ao que tudo indica, sim.
Segundo Gené Teare, da plataforma Crunchbase, “a grande retração global que todos esperávamos no capital de risco está realmente a acontecer.” No terceiro trimestre de 2022, este tipo de investimento totalizou 81 mil milhões de dólares, menos 90 mil milhões (53%) do que na mesma altura do ano passado e menos 40 mil milhões (33%) do que no trimestre anterior. “É um grande trambolhão no financiamento”, escreveu. De facto, é.
Desconfio que não era isto que esperava ler semanas depois de ter sido aberta a Fábrica de Unicórnios, em Lisboa, e de cerca de 70 mil pessoas terem passado pela Web Summit. Mas, retirados os confetti, também é disto que falamos quando o assunto são unicórnios.
Em 2022 (até novembro), e segundo dados da mesma plataforma, entraram para o clube dos unicórnios 295 empresas – em 2021, entraram 614. Mais: se, em 2021, 44% do capital de risco investido em startups teve como destino as empresas de mais de mil milhões de dólares, em 2022 essa percentagem cai para metade – 22%.
A ideia não é ter um discurso pessimista, antes realista. Os unicórnios (estes!) existem e vão continuar a existir – são empresas que estão a moldar o futuro. Mas, entre os milhões, as fábricas, as luzes dos palcos e a adrenalina de fundar e trabalhar num projeto com este tipo de ADN, é importante não perder a realidade de vista. E a realidade é esta: ninguém é uma ilha, ninguém vive isolado, ninguém é imune à geopolítica e à economia mundial – mesmo que valha mais de mil milhões de dólares. Mesmo que seja um unicórnio. E, sendo um unicórnio, então o melhor é vestir a armadura para as adversidades (os tempos exigem-no) e deixar que a fábrica trabalhe a todo o gás.
