Black Friday vs. Green Friday: de que lado queremos estar?

Todos os anos, marcas, profissionais de marketing, grandes superfícies comerciais e os próprios consumidores alinham as suas estratégias para celebrarem mais uma Black Friday. O apelo ao consumo massificado e descartável não é exclusivo desta época, mas intensifica-se e, sempre que chegamos à reta final de mais um ano, assistimos ao mesmo fenómeno: embebidos pelo ardil dos super descontos, os consumidores embarcam numa jornada desenfreada, fazendo do verbo “comprar” a sua missão número um.

O conceito não é novo nem é nosso: surgiu nos Estados Unidos da América, como forma de assinalar o arranque da época de compras natalícias, sendo convencionado que se celebra sempre na última sexta-feira de novembro, após o feriado do Dia de Ação de Graças. Os anos foram consolidando a ideia, fazendo emergir rituais e reforçando o buzz em torno da data e, hoje em dia, a Black Friday é omnipresente, incontestável e um dos dias mais importantes no comércio, a nível global.

Para as marcas, as grandes campanhas, descontos e promoções revelam-se uma excelente forma de atrair clientes e gerar negócio; para esses clientes, a Black Friday é a chance de dar conta da “wishlist”, adquirindo aquele artigo com que se tem vindo a sonhar a um preço mais em conta, ou aproveitando para trazer aquele item de que se pode vir eventualmente a precisar. Como diz a expressão popular, “junta-se a fome à vontade de comer” e, de repente, o cesto de compras está cheio com tudo aquilo que não se pôde deixar escapar, tamanha era a oportunidade.

Pelo caminho, perde-se de vista o propósito e o verdadeiro custo deste ritual consumista, que pode ser entendido como inofensivo, mas não é. Enquanto marcas e empresas, temos uma quota de responsabilidade quanto àquilo em que a Black Friday se pode tornar. Cabe-nos optar por que caminho enveredamos: se pelo do incentivo ao consumo massivo, despreocupado e sem qualquer consideração pelas consequências, se pelo da pedagogia, propondo soluções e produtos sustentáveis, convidando à reflexão e adotando um posicionamento sensível quanto às questões sociais e ambientais que nos rodeiam.

Felizmente, assistimos gradualmente a um paradigma em mudança, com uma sociedade civil mais desperta e consumidores mais conscientes. Estes optam cada vez mais por comprar marcas que partilham dos seus valores sociais e ambientais, o comércio local vai recuperando protagonismo, o preconceito contra artigos em segunda mão vai-se dissipando, e os produtos artesanais, de baixo impacto e baixa escala, vão conquistando preferências. As marcas, por convicção ou necessidade, começam a refletir essa transição nas suas estratégias e, hoje em dia, já se tornam relativamente comuns iniciativas que propõem retomas ou troca de artigos antigos por benefícios, ações de compensação da pegada ecológica de cada vez que um cliente adquire um produto, ou campanhas em que o valor das compras reverte para ações de caráter ambiental.

Surge, então, o conceito de Green Friday, uma espécie de contrabalanço, uma lufada de ar fresco que oferece uma alternativa mais ponderada e responsável à tradicional Black Friday. A base do consumo mantém-se inevitavelmente, mas de forma mais regrada e benéfica, com opções mais “verdes” e escolhas mais educadas. Hoje, mais do que incentivar os consumidores a comprarem sem critério, é fundamental mostrar-lhes a importância de tomar a decisão certa, quais as consequências e qual o contributo que poderão estar a dar para um mundo mais saudável e sustentável. As marcas têm, sem dúvida, algo a dizer e fazer sobre isto, e a inércia vai deixando de ser opção.

Com relatos de recursos naturais precocemente esgotados, de aterros sobejamente lotados e de oceanos cada vez mais conspurcados, o movimento Green Friday nunca fez tanto sentido. A questão que agora se impõe é: de que lado queremos estar?

 

Eurico Estêvão, Marketing Manager na Phenix Portugal

 

briefing@briefing.pt

Segunda-feira, 22 Novembro 2021 10:16


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