“No Brasil há uma expressão engraçada que encaixa perfeitamente com a situação vivida aqui nos EUA durante esta crise de Covid-19:
Um dinossauro à espera do meteoro.
Refere-se basicamente aquele indivíduo que sabe o que está por vir. Está na cara dele. Mas prefere esperar pacientemente para ver o desfecho da situação. Mesmo que o ‘desfecho’ seja dele próprio.
Aqui em Nova Iorque ouvíamos falar do temido Coronavírus já havia muito tempo. Notícias diárias sobre o avanço da doença, primeiro na China, e depois por outros pontos do globo, pipocavam diariamente nos noticiários. E nós, como bons Velociraptors, seguíamos correndo por aí, vivendo nossa vidinha.
Tem uma luzinha brilhando lá no céu!
Aglomerações por aqui são (eram) parte do dia a dia constante do nova-iorquino padrão. Eu mesmo pegava um metro cheio para ir e outro para voltar diariamente, desembarcando em uma das estações mais lotadas de humanos (e turistas) por metro quadrado da grande maçã: a Grand Central Terminal, lugar onde o distanciamento social de dois metros para outro indivíduo era simplesmente uma utopia.
No começo, eu e tantos outros não nos importávamos muito. ‘’Ora, estamos no coração dos Estados Unidos da América! Eles nunca vão deixar que algo de mal aconteça por cá. Já estão escaldados com torres gémeas e terrorismo. Estamos protegidos.’
Olha, aquela luzinha está maior!
De repente, apareceu o primeiro caso nos EUA. Depois, um punhado em Washington. Em seguida, o primeiro caso em NY. Mais dois, agora em Queens.
E o que o réptil aqui fez? Percebeu que a rota do transporte diário era uma linha reta, e aprendeu a andar nas carruagens sem precisar se segurar. Aulas de equilíbrio ao jogar Mario Kart no Iphone. Como um verdadeiro tiranossauro a segurar o aparelho com seus pequenos bracinhos…
A luz está ainda mais brilhante? Não, só impressão.
Uma semana antes de fecharem tudo, ainda fui a uma hamburgueria com toda a família. Restaurante cheio de brontossauros, tricerátops, pterodáctilos e afins, se deliciando com suas suculentas carnes. Lá fora uma placa dizia em tradução livre: ‘Eu não sobrevivi às raves dos anos 90 para cair diante de vírus com nome de cerveja barata’.
Olha que está sim mais brilhante. E bem maior!
Dois dias antes de fecharem todas as escolas do estado, minha filha ainda fez um passeio em um grande museu da cidade. Ela e todas as crias jurássicas passearam despreocupadas pelos corredores do local.
De repente, o som da aquela outrora luzinha no céu se tornou audível
E dois dias depois chegou. Com um estrago imenso.
Quando escrevo esse texto, já lá vamos no dia 53 de quarentena. Fechados em casa, esperando a poeira do meteoro baixar.
A boa notícia é que os gases venenosos causados pelo choque já estão menos densos. A melhoria ainda é ínfima. E ainda vamos a alguns meses de poder colocar nossos narizes (de máscara) para fora das nossas tocas. Mas sim, pequenos fios de claridade começam a ultrapassar as pesadas e negras nuvens que, durante dias, fecharam os olhos daquela que era a cidade que nunca dormia.
Seguimos esperando por dias melhores. E que os dinossauros por cá possam evoluir, para terem mais sorte que aqueles de antigamente.”