Meter o nariz ao barulho

O que diria uma marca se pudesse explorar uma relação emocional mais profunda com os seus clientes enquanto regista um aumento do volume de vendas entre 5% a 10%, 5% no preço que o cliente está disposto a pagar, 123% na intenção de compra e 33% no prazer emocional?

 

Acordamos com likes e posts nas redes sociais, deixamos a descendência na escola enquanto respondemos a SMS e emails, ouvimos as notícias no trânsito e recebemos chamadas à porta da primeira reunião do dia. Entram 120 mensagens no grupo de chat, seguidos de um wrap de frango. Saem uns gramas na aula de RPM e passa-se uma tarde a correr, sem levantar os olhos do computador. Quando chegamos finalmente ao sofá, adormecemos no genérico da série que adoramos aos bochechos. Durante este percurso arrisco-me a dizer que todos os estímulos foram visuais e sonoros, isto porque refeições à pressa não têm sabor. Com cerca de 5.000 mensagens publicitárias por dia, não é de admirar que as pessoas andem pouco sensíveis ao que lhes tentam transmitir.

Vários estudos científicos afirmam ser 100 vezes mais provável lembrarmo-nos de um estímulo olfativo do que de algo que ouvimos, vemos ou tocamos (ou tocávamos, antes de sermos higiénicos à força). Esta proeza depende dos recetores olfativos no cérebro, diretamente ligados ao sistema límbico, responsável pelas emoções e que dá origem a memórias olfativas.

É possível identificar cerca de 10.000 odores diferentes, sendo que 65% são reconhecidos com precisão até mais de um ano depois. A capacidade de reconhecermos algo que vimos é apenas de 50% após três meses. 75% das nossas reações emocionais diárias são cultivadas através do olfato. Por esse motivo, os odores influenciam o estado emocional e o comportamento de consumo.

Recorrer ao marketing olfativo como estratégia não é novo, remonta aos primórdios das trocas comerciais em que vendedores árabes recorriam a incenso para atrair compradores. Muitos narizes depois, em 2012, a Dunkin’ Donuts, na Coreia do Sul, decidiu conquistar terreno junto dos amantes de café e criou uma fragrância bem tirada que instalou nos autocarros da cidade. O difusor pulverizava a fragrância ao som do seu jingle e o resultado foi um aumento de 16% do número de visitantes às lojas e de 29% no volume de vendas. Mais tarde, o Hard Rock Hotel, de Orlando, recorreu à estratégia para reproduzir o aroma de cone de waffle. O resultado foi um crescimento de 50% na venda de gelados. A Nike realizou um estudo em que descobriu o aumento da intenção de compra em 84% graças a uma fragrância à base de aromas florais nos pontos de venda.

Mas nem tudo são vendas. Um exemplo deu-se no Metro de Nova Iorque, que, após implementar uma fragrância à base de lavanda, reduziu os índices de violência nas suas estações. Estas ações são desenvolvidas de acordo com a cultura da marca, valores e objetivos, até que nasce um odótipo, a fragrância originada a partir de elementos da marca que definem a sua personalidade e a colocam, literalmente, no top of mind.

A identidade visual de uma marca não deixa de ser fundamental para o seu reconhecimento, posicionamento e comunicação – benefícios tão tangíveis quanto legítimos. Mas, no meio de todo o ruído que nos rodeia, as marcas que desenvolvem a sua identidade olfativa conseguem despertar emoções diretamente no córtex cerebral, sem a interferência de processos lógicos, criando uma sensação de bem-estar e goodwill tão simples quanto entrar num apartamento com aroma ao bolo da nossa avó e nos fazer sentir imediatamente em casa.

Catarina Alves Ribeiro, diretora de Marketing da Coldwell Banker Portugal

briefing@briefing.pt

 

Segunda-feira, 11 Maio 2020 08:36


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