O espaço não é novo. Antes pelo contrário. Há 32 anos que existe na Rua Damasceno Monteiro um restaurante bem conhecido dos lisboetas, o Via Graça. Mas, agora a cozinha clássica ganhou a companhia de uma nova visão sobre a gastronomia portuguesa. É o 9 B – e não tem que enganar, porque é o número da porta.
Foi em pleno período de confinamento que se fizeram as obras que deram nova vida ao Via Graça, que se manteve no piso inferior, e lhe acrescentaram o 9 B, no piso de entrada. O responsável é João Bandeira, proprietário do espaço, movido por uma vontade de arrojar e deixar marca no panorama gastronómico. O conceito é dele, mas é o chef Guilherme Spalk que o coloca em prática, com pequenos ajustes aos pratos mais emblemáticos da casa no Via Graça e dando largas à criatividade no 9 B.
Guilherme é jovem, mas já tem algumas cozinhas de renome no currículo. Estudou na Escolha de Hotelaria e Turismo do Estoril, mas diz que é mais de prática do que de teoria: estagiou no Bocca, do chef Alexandre Silva, onde esteve um ano, mudou-se depois para Barcelona e o ABaC, voltou a viajar, primeiro para a Bélgica e de seguida para a China. De volta a Lisboa, esteve no Bonsai, no Tavares Rico e no grupo Sea Me. Até que, em 2019, chega ao Via Graça.
No 9 B, assume uma brigada de jovens cozinheiros, numa cozinha aberta para a sala. Aqui João Bandeira quis criar um ambiente sofisticado, onde dominam a madeira de nogueira e as cores fortes, a enquadrar quadros do pintor Diogo Navarra.
Entremos, então, na carta. Guilherme começa por dizer que não é muito artístico, que não vemos ver os seus pratos muito enfeitados. Nem é preciso. Mas o empratamento acaba, de certa forma, por contrariar as palavras do chef e comprovar a máxima popular do início deste texto – os olhos também comem. Aliás, mesmo antes da degustação, o que chama a atenção é a loiça – todas as peças foram desenhadas por ele, com um ceramista nacional, com os tons claros a contrastarem com o ambiente mais intimista do restaurante. São todas diferentes, porque as criações que vão servir também o são.
São duas as propostas de Guilherme Spalk para este 9 B, dois menus que, diz o chef, são inspirados em memórias dos sabores da cozinha tradicional. Assim, o menu 9 + b envolve nove momentos que são uma homenagem a Lisboa, não admirando, por isso, que o lugar de honra seja do peixe (ainda que o peixe não seja alfacinha e provenha de outros mares): lula dos Açores e coentrada; carabineiro de Vila Real e pão velho; salmonete com percebes e amêijoa da Ria Formosa. Não provamos, mas com pena, porque há uma pré-sobremesa desafiante, em que o cliente é desafiado cliente a lamber um prato de creme queimado. Literalmente.
O segundo menu propõe 18 momentos, ou não fosse 9 + 9. A viagem gastronomicamente é maior, sai de Lisboa e avança pelo país. Continua a haver sabores do mar, mas também da terra e da horta, bem como carne. E criatividade, como as folhas com pó de pistácio, servidas em ramos secos ao centro da mesa.
Tudo acompanhado por vinhos escolhidos pelo sommelier Diogo Frade, de uma garrafeira vasta enriquecida por João Bandeira – são sete metros de um corredor climatizado ao qual se chega pela escadaria que dá acesso ao Via Graça. Mas isso fica para outra altura.