Briefing | É diretor de Marketing e Comunicação da McDonald’s Portugal desde 2019. É tempo suficiente para deixar a sua marca na estratégia?
Sérgio Leal | Na realidade, foi um período obviamente atípico, porque, logo um ano depois, enfrentámos uma pandemia. Considero que é um enorme desafio, mas também uma enorme oportunidade. Aliás, olho mais como uma oportunidade, porque, perante um contexto completamente instável, incerto, de grande insegurança a todos os níveis do negócio e da própria sociedade, a marca acabou por ter um papel muito relevante. Continuando a estar aberta, continuando a ter padrões elevadíssimos de segurança e de confiança, continuando a servir refeições. E a verdade é que a marca saiu mais forte da pandemia, em todos os seus parâmetros, em quota de mercado, em confiança na marca, a relação dos portugueses com a McDonald’s. Foi um enorme desafio, mas, felizmente, conseguimos reforçar o nosso papel em Portugal e, hoje em dia, estamos numa posição ainda mais forte. Não foi muito tempo, mas foi um tempo muito importante para tomar as decisões certas, junto com os nossos franqueados. Talvez tenha sido a grande aprendizagem, o grande fator de diferença: foi, muitas vezes, tomar as decisões difíceis para o curto prazo, que podiam não ser as mais óbvias para controlar custos e minimizar riscos, mas que eram as certas para o que os portugueses precisavam na altura. A marca conseguiu ser realmente útil à sociedade e isso tem um efeito a médio e longo prazo.
Como é que a marca chega a 2023?
O que percebemos, após a pandemia, é que havia a oportunidade de sermos ainda mais fortes e mais relevantes, sobretudo junto das gerações mais jovens. Com a reabertura do mercado, notámos que a recuperação para os níveis de 2019 aconteceu de forma mais rápida noutros segmentos, por exemplo, nas famílias, mas, nos mais jovens, o crescimento não acontecia ao mesmo ritmo do negócio em geral.
Foi, para nós, um alerta, um sinal de que, depois de um posicionamento de marca mais institucional, necessariamente mais séria e mais adulta, durante a gestão a pandemia, era altura de reganhar um pouco aquela vertente mais divertida e mais jovem.
E é aí que surge este foco na Geração Z. As gerações mais jovens são mais desafiantes, porque mais exigentes com as marcas, mas também são os consumidores – os adultos e as famílias – do futuro. E a perspetiva é ir ao encontro das suas necessidades hoje, para garantir que a marca continuará a ser relevante no futuro. Internamente, falamos muito no “future proof” da marca, isto é, ter uma marca à prova do futuro, e é isso que temos procurado fazer.
A que atribui esse regresso menos rápido, digamos assim, dos consumidores mais jovens?
Penso que a pandemia mudou um pouco os comportamentos e, se houve alguns que foram readquiridos mais rapidamente, houve outros que demoraram mais tempo. É normal e é um fenómeno visível em muitas facetas da sociedade.
Ao longo dos anos, temos feito muitos estudos com foco nas gerações mais jovens e verificamos que, de facto, adoram os nossos produtos, os restaurantes, a experiência. Mas, quando aprofundámos o tema, percebemos que havia oportunidade de a marca ter uma presença mais ativa nas suas vidas, nomeadamente entre visitas à McDonald’s. Isto é: nas visitas está tudo bem, mas, entre duas visitas a um restaurante, a marca acaba por estar menos visível e menos presente nas suas vidas. Este foi o grande insight. E, a partir daí, tentámos perceber, inclusivamente com eles, como é que a marca poderia fazer mais, o que nos estava a faltar para reconquistarmos este lado mais emocional, esta ligação com as gerações mais jovens.
Temos desenvolvido várias iniciativas nesse sentido, e uma delas foi um workshop, durante uma semana, em Lisboa, em que juntámos as nossas agências, criativos de todas as partes do mundo, influencers e jovens da Geração Z, para nos ajudarem a debater este tema, ou seja, em que medida é que a marca poderia ser mais relevante. Foi um processo muito interessante e do qual saíram várias ideias que, depois, viram a luz do dia. Mas, mais importante do que isso, foi percebermos que há uma mudança de mindset da marca e das agências no sentido de, em tudo o que fazemos, conseguimos ir buscar a inspiração que tirámos desses dias.
E o que é que estava a faltar? O que é que é possível fazer para manter essa relevância entre visitas?
Uma das principais aprendizagens tem a ver com a marca estar mais presente na cultura deles, ou seja, no fundo, ser parte da conversa que têm entre eles, com os amigos, agir como uma marca icónica que é, interagir com eles de novas formas e de formas muitas vezes inesperadas, mais surpreendentes, ajudar a resolver problemas reais nas vidas deles.
Nós temos um plano de marketing, de inovação, com lançamento de produtos, mas, quando falamos desta geração, há coisas que não podem ser tão planeadas, portanto, tem de haver um lado do nosso plano mais flexível, mais fluido, que permita adaptar-se àquilo que está a acontecer na cultura, porque a cultura e as tendências não se programam com um ano de antecedência. Portanto, a marca tem de ter esta capacidade de estar atenta e de fazer parte do que está a acontecer.
Isto significa juntar novas iniciativas ao nosso plano, mas também uma comunicação mais rejuvenescida, com a linguagem deles. Nos últimos meses, temos vários exemplos, nomeadamente a campanha do Surfries, que marcou a nossa entrada no TikTok e foi, talvez, a primeira campanha já com esta lógica. No fundo, surpreendíamos as pessoas, um pouco por todo o País, com o que chamamos os Feel Good Moments, momentos de partilha com o nosso produto mais democrático, as batatas fritas. Correu muito bem, teve um impacto bastante positivo e foi, digamos assim, o primeiro passo desta jornada.
Esta campanha simbolizou uma inovação na comunicação, quer nos meios, quer na linguagem. Era mesmo importante dar esse passo?
É uma nova forma de comunicar, fundamental para a McDonald’s se reaproximar destes jovens. Mas, ao mesmo tempo, a McDonald’s é uma marca que chega a toda a gente, pelo que não pode comunicar de uma forma que os adultos rejeitem, nomeadamente as famílias. Portanto, tem de ser uma forma que seja relevante para a Geração Z, mas que, ao mesmo tempo, seja aspiracional para as outras faixas etárias que nos visitam.
Algo que é também muito interessante partilhar deste workshop, e que, para nós, foi uma aprendizagem muito grande, foi quando perguntámos a alguns destes jovens o que a McDonald’s estava a fazer mal, eles responderem que não fazíamos nada de errado. Por vezes, esta indiferença, esta neutralidade é importante. Faltava o tal extra mile. E a questão foi passarmos estas pessoas neutras para fãs da marca. É um caminho fundamental para elevar a ligação emocional à McDonald’s.
Fátima de Sousa
Leia a entrevista na íntegra na edição impressa de novembro de 2023.