Baptista-Bastos figura entre os imortais do NewsMuseum

“Todos sabíamos onde estava o jornalismo do Baptista-Bastos antes do 25 de Abril, durante o 25 de Abril e depois do 25 de Abril”. As palavras foram ditas pelo jornalista e escritor Fernando Dacosta, esta quinta-feira, na inauguração da exposição multimédia evocativa do NewsMuseum ao jornalista e escritor que ficou conhecido do grande público pela pergunta “Onde é que você estava no 25 de Abril?”

Fernando Dacosta aludia à frase repetida ao longo das várias emissões do programa de entrevistas ‘Conversas Secretas’, da SIC, para recordar o jornalista interventivo com “muitas reservas em relação à questão da objetividade do jornalismo”, que se junta agora ao espaço Os Imortais do NewsMuseum. “É o nosso panteão onde albergamos os jornalistas que foram da lei da morte libertados”, explica o presidente da Associação Ata Diurna, Luís Paixão Martins. Baptista-Bastos foi, diz, uma dessas pessoas que “marcaram a vida dos jornalistas”. Sobre a homenagem, afirma que acontece um pouco tarde no tempo, em virtude da pandemia, mas que não houve dúvidas quanto à justiça da escolha. “Em relação ao Baptista-Bastos foi uma decisão muito rápida”. Lembra quando, com 15 ou 16 anos, foi visitar O Século, onde o homenageado iniciou a carreira, aos 19 anos: “um edifício com grande envergadura. E os jornalistas também me pareciam ser”. Recorda nessa geração um “certo romantismo da escrita, pessoas com grande cultura e com grande capacidade de escrita”, ainda que houvesse algumas “coisas piores que hoje em dia”, como “mais hierarquia e muito poucas mulheres nas redações.

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O curador do NewsMuseum Alexandre Manuel (e também jornalista e professor universitário) reitera a certeza da pertença do jornalista falecido em maio de 2017 a este panteão daqueles que o jornalismo imortalizou: “É mais que evidente que, pese embora as limitações ditadas pelo espaço, o nome de Baptista-Bastos teria sempre aqui um lugar garantido, como a partir de hoje vai acontecer”. Ainda que não tenham coexistido nas redações, gosta do “jornalista ateu e não agnóstico”, “com sede de absoluto e leitor regular da Bíblia e das Confissões de Santo Agostinho, cético, mas bem informado, marxista agnóstico”. Seguidor fiel do ditado popular ‘quem conta um conto acrescenta um ponto’ – “e ele por vezes acrescentava e muito”, nota, sobre o distanciamento do repórter. A propósito, cita: “Toda a tragédia humana me comove. Não sei o que é jornalismo distanciado, como se o jornalista nada tivesse que ver com o acontecimento e o jornal nada tivesse que ver com o jornalista nem com o leitor. Não contem comigo para essa rábula”.

O também curador do NewsMuseum Adelino Gomes lembra o “jornalista interveniente do tempo em que vivia”, num discurso em que recorreu a excertos do seu trabalho. Alguns dos quais gostava de ter escrito, admite. Vê-o como um “grande cronista português”, destacando os recolhidos como uma das marcas mais importantes da sua escrita, aventando mesmo que tenha sido o seu criador.

“Ninguém escreve assim, só um grande escritor”, diz. “Em cada frase apanha-nos desprevenidos”, “transporta-nos a outro mundo”. E é a ele, entende, que devemos a definição perfeita de repórter: “O que vai ali, vem já, olhar rápido, palavra célere”.

Já o amigo Fernando Dacosta descreve-o como “pioneiro, corajoso, denunciador”. Conhecido pelo feito difícil – “exasperava-se com frequência”, engraçou com o também escritor. “Era muito culto, informado e trabalhador” e defensor de que o jornalismo não era menor em relação à literatura. “O BB era um exemplo superior”, defende, revelando que o poeta Jorge de Sena que confidenciou que lia os seus textos para aprender, pela inovação e imaginação que lhes conferia.

A exposição multimédia conta com os testemunhos de Fernando Dacosta, Isaura Baptista-Bastos, Mário Zambujal, Francisco Pinto Balsemão, Alexandre Borges, Gonçalo Pereira da Rosa, Rui Cardoso e Ernesto Rodrigues.

sd@briefing.pt

 

Sexta-feira, 23 Setembro 2022 11:44


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