Briefing | Há cinco anos que a CR&F integra o portefólio da João Portugal Ramos. Qual a mais-valia para a marca deste regresso a mãos portuguesas depois de ter integrado uma multinacional?
Raquel Almeida | A marca CR&F esteve integrada numa multinacional durante cerca de 20 anos. Embora trouxesse alguma segurança à marca, trazia também um grande desfoco na mesma, em algumas áreas de marketing e operações. Nesse sentido, uma das grandes mais-valias que a marca tem por ter integrado o portefólio da João Portugal Ramos é o maior foco das equipas nacionais e de exportação e um maior conhecimento do mercado português. Por exemplo, quando a CR&F ingressou no grupo, a primeira prioridade foi realizar estudos de consumidores para aprofundar o nosso conhecimento da marca, de modo a que a estratégia de marketing fosse objetiva. Este maior foco e interesse, em conjunto com a sinergia que se estabelece com o know-how da área vitivinícola, foram as grandes vantagens desta mudança.
E qual a mais-valia para a JPR de incorporar esta marca na sua oferta?
Primeiro que tudo, a diversidade de portefólio que a gama João Portugal Ramos pode oferecer. Conseguir alargar a gama aos clientes com uma aguardente como a CR&F é um complemento muito positivo. Segundo, as sinergias de distribuição também são bastante positivas, pois criam-se dinâmicas de vendas entre os vinhos e as aguardentes que permitem o desenvolvimento do conjunto das marcas. Por último, ter uma marca com uma quota de mercado que ronda os 60% representa um incremento financeiro altamente positivo.
Estamos a falar de uma marca com 125 anos. A idade pesa numa marca de aguardentes? O que lhe traz?
Pesa claramente, mas pela positiva. O consumidor deste tipo de bebidas valoriza a qualidade e a sua constância e isso é um ponto chave na identidade desta marca. Podemos dizer que, ainda hoje, os principais métodos de produção inicialmente seguidos pelos adegueiros da casa são mantidos e isso é a base para a mesma qualidade de sempre. Claro que há métodos que foram aperfeiçoados à medida dos tempos, mas as fórmulas iniciais estão lá.
Estes 125 anos de histórias com os nossos consumidores trazem experiência, tradição e confiança.
Como manter a identidade numa marca histórica e, ao mesmo tempo, inovar?
A tradição e a inovação podem caminhar juntas, mas, sem dúvida, que esse é um dos grandes desafios das marcas centenárias. Há muitos elementos tangíveis que fazem parte do ADN da marca CR&F e que se consideram intocáveis, como é o caso do formato da garrafa, o lacre e a palete de cores que é utilizada na maior parte dos seus touch-points com o consumidor. Estes elementos, a par da consistência secular da aguardente, isto é, a qualidade do nosso líquido, são o principal ativo da marca, que permite manter uma grande parte da identidade ao longo dos tempos, preservando um dos principais legados, nomeadamente, o seu passado.
Isto quer dizer que inovamos sempre dentro daquilo que a nossa herança nos permite inovar. Para dar apenas um exemplo: não nos poderíamos tornar uma marca de lifestyle virada para cocktails apenas porque o mercado está com essa tendência. Isso não faz parte do nosso ADN e iria quebrar o legado e a mística da marca.
O facto de ter entrado para o grupo João Portugal Ramos, uma empresa de enólogos que gosta de inovar, trouxe um olhar mais atento no que toca à inovação de produto. São feitas constatemente provas de aguardentes com perfis diferentes sob um olhar atento e criterioso. Daí resultou o relançamento da antiga CR&F Bagaceira com um perfil distinto e temos em plano lançar outras novidades premium para o mercado nos próximos tempos, sempre dentro do ADN da marca.
Além disso, também procuramos inovar através daquele que é o principal veículo de comunicação da mesma – a embalagem. Todos os elementos de packaging são, para esta marca, items de referência na escolha do produto e, portanto, é aqui que enfatizamos grande parte da inovação, oferecendo ao consumidor uma imagem atualizada e em constante sintonia com as tendências de mercado. Inovar pelo packaging é um requisito do nosso modelo competitivo.
Há, de alguma forma, a preocupação de modernizar a marca, por exemplo, em termos de imagem?
Sim, sempre. Qualquer marca centenária deve conseguir separar e perceber quais os elementos associados à tradição e ao seu ADN e os elementos que, gradualmente, podem ser modernizados. Modernizámos gradualmente o lettering dos rótulos, tornando-os mais simples e sofisticados na nossa referência core, alterámos recentemente a serigrafia e estojo da nossa referência mais premium, e temos praticamente todos os anos o projeto de alteração de packaging de Natal, pois é um momento crucial de comunicação da marca. Tudo isto mantendo os elementos chave da sua identidade: os pantones principais, o lacre e a icónica garrafa.
O que tem sido feito para atrair novos consumidores?
O principal desafio é atrair os consumidores que começam agora a entrar nesta categoria, ou seja, que ainda não estão familiarizados com as marcas, mas que querem experimentar aguardente. Para esse efeito, é importante a construção de uma estratégia de presença no on-trade com distribuição e visibilidade, apoiada no nosso distribuidor nacional, a Empor Spirits. Isto permite à marca continuar a estar presente no on-trade tradicional, mas que, cada vez mais, seja consumida em restauração mais seletiva e exclusiva, para chegar ao maior número de consumidores possível.
E consumidores mais novos, há essa preocupação? Afinal, o consumidor típico de aguardentes anda pelos 50 anos…
A grande faixa de consumo está realmente acima dos 45 anos de idade, no entanto, cada vez mais surgem consumidores na casa dos 35 anos, marcados pela exigência e que guiam as suas escolhas bem informadas, tanto pelo grau de confiança que estabelecem com as marcas, como pela qualidade dos produtos. A nossa estratégia não passa por rejuvescer o consumo atual, mas, sim, por sermos a primeira marca que o consumidor seleciona quando entra na categoria, por volta dos 35 anos. Essa é a nossa principal aposta, estar no primeiro momento de escolha do consumidor quando quer experimentar uma aguardente.
E em relação ao marketing? Qual é a abordagem?
Estar onde o nosso consumidor está é a principal premissa de uma estratégia de marketing direcionada para uma plena distribuição da marca. Adotamos também uma forte componente de marketing relacional com os principais clientes, sejam eles on-trade ou off-trade. Isto permite-nos criar relações bem-sucedidas de longo prazo com parceiros chave, tanto com clientes como fornecedores, de forma a manter uma preferência de longo prazo pela marca.
Há investimento em publicidade propriamente dita? Em que suportes?
A maior fatia de investimento, como dito anteriormente, ocorre no trade, chegando ao consumidor com presença e visibilidade no maior número de pontos de venda possíveis. O investimento above the line representa uma fatia menor e os suportes geralmente selecionados são os outdoors e a imprensa.
Curiosamente, apesar de ser uma marca muito presente à mesa dos portugueses, ainda não chegou ao digital. Sabemos que talvez o futuro passe por aí, e estamos muito atentos ao melhor momento para entrar, mas sabemos igualmente que quando o fizermos queremos deixar bem vincado o enorme legado que temos em mãos, a saber, o de uma aguardente nacional que está há 125 anos com os portugueses. Veremos o que o futuro próximo nos reserva ao nível da abordagem de marketing a adotar, até porque aceitamos ser desafiados por qualquer agência que nos esteja a ler.