Era uma questão de ocupar o espaço mediático, de ficar na memória do consumidor. Datam daí máximas como “não há publicidade má” ou “o que importa é que falem, desde que falem”. Hoje, quando marcas e personalidades podem ser arrastadas durante dias em shares e caixas de comentários nas redes sociais, 24/7, por milhões de utilizadores de literalmente toda a parte do mundo, aquelas velhas máximas tornaram-se, digamos, discutíveis.
Depois, veio o tempo em que era preciso explicar. Com todo o espaço mediático ocupado e multiplicado, cheio de concorrentes em todas as categorias de consumo, era preciso explicar porque é que eu deveria comprar o produto x em vez do y. Remonta a essa época a origem de toda uma genealogia de anúncios com “especialistas” em bata branca, cuja simples existência factual nunca ninguém se deu ao trabalho de verificar ou que não tinham sequer nome que pudesse ser rastreado e que tentavam convencer o potencial comprador, lá em casa, de que aquele detergente lavava mais branco, que a maioria dos dentistas preferia aquele dentífrico; que, na sua vida pessoal, se fosse para usar outra marca de pneus, o piloto de Fórmula 1 simplesmente preferia ir a pé.
Até que veio o tempo que vivemos, o tempo em que é preciso mostrar. O consumidor já perdeu demasiadas vezes a inocência. Já foi demasiadas vezes ao outro lado do espelho para se deixar levar em simples conversa de vendedor. Já sabe que, sob um ângulo qualquer, até arrancar um dente pode ser vendido como uma experiência magnífica. Hoje, ele precisa de ver. Mostrem-lhe que são, realmente, capazes de alguma coisa extraordinária. Provem. Não se fiquem pelo mundo encantado dos anúncios – venham para o mundo real.
Isto não significa que as marcas precisem todas de ir a correr produzir happenings e tentar sacar vídeos pretensamente virais em que salvam o dia e se mostram movidas por nada mais que a sua consciência social – de novo: o consumidor é hoje tudo menos inocente e não perdoa ser enganado. Há ferramentas que têm estado sempre ao dispor das marcas ao longo de todo este processo de evolução da comunicação e que nunca saíram de moda pela simples razão de que emitem noutra frequência, rodam mais alto. Fazem tendências, não podem ser desfeitas por elas.
Humor e criatividade são instrumentos que provam. Não se limitam a mostrar nem a racionalizar; eles disparam directamente ao lugar mágico do nosso cérebro onde se produzem as endorfinas, uma hormona saída da nossa caixa de opioides de fabrico próprio e que inibe a dor, faz descer o cortisol (a hormona do stress), ativa o sistema imunitário e até combate o envelhecimento (ao remover superóxidos). A erupção do riso ou o maravilhamento do espanto nascem muito antes de toda a informação que o consumidor já carrega. É um salto ôntico que galga etapas, evade-se do retorcido labirinto do pensamento.
O riso foi um dos últimos bastiões a cair numa certa noção de exclusividade humana. Sabemos hoje que os chimpanzés riem e, mais interessante ainda, que nós mesmos, seres humanos, rimos até aos 18 meses como chimpanzés: durante a inspiração e a expiração – só depois aprendemos a rir apenas enquanto exalamos. Os indícios apontam, portanto, para que os nossos longínquos antepassados comuns já fossem capazes do riso, muito antes do pensamento ou da linguagem. O riso era – é – uma ferramenta que cria vínculos entre criaturas sociais. Rimos e voltamos ao princípio. Rimos e ligamo-nos.
Muito em breve, veremos a inteligência artificial a produzir humor. Não lhe será difícil aprender depressa uma série de truques e tempos da comédia. Mas ela nunca poderá rir, não mais do que uma mera imitação mecânica do som ou do movimento espoletados por uma gargalhada.
O riso, e a sua prima direita criatividade, avultarão cada vez mais como factores distintivos de uma comunicação feita a pensar nas pessoas. São atributos que se colam às marcas: “esta marca faz-me rir”, “esta marca é criativa”, “esta marca é provocadora, rebelde, surpreendente”, “esta marca dá-me prazer”. Riso e criatividade fazem de um momento de comunicação não uma mera promessa, mas uma oportunidade de vínculo imediato. Nunca sairão de moda. Funcionam desde os chimpanzés.
Afinal, nas imortais palavras de Jessica Rabbit quando questionada sobre o que via no marido meia-leca e orelhudo: “He makes me laugh”.
Simples.
Alexandre Borges. Creative Director da LPM Comunicação