Briefing | Pode dizer-se que 2014 foi um bom ano para a BBDO?
Rui Silva | Foi um ano bastante bom, muito em consequência do trabalho feito em 2013, pois alguns dos projetos transitaram para 2014. Tivemos bons resultados em termos de campanhas, foram campanhas muito eficazes. Foi um ano de qualidade.
Briefing | Também foi um ano de prémios…
RS | Foi, sem dúvida, um dos grandes anos da BBDO. Os prémios foram consequência do trabalho desenvolvido e acabaram por reconhecer um ano extremamente focado naquilo que acreditamos que é a função de uma agência – trazer soluções estratégicas e criativas, trazer retorno para o investimento dos clientes. Não fazemos exercícios académicos. Acreditamos profundamente na profissão.
Briefing | Boa parte desses prémios concentrou-se num único cliente e projeto. E agora? A responsabilidade para com esse cliente aumenta?
RS | Coloca a fasquia onde ela deve estar. Acreditamos que não devemos procurar ser discretos, devemos procurar ser assertivos e fazer “barulho” naquilo que se faz. Faz parte da nossa missão.
Nós não encaramos a publicidade de uma forma tradicional ou não tradicional. Acreditamos que existem objetivos de comunicação por parte dos clientes e o projeto da Mercedes respondeu a todos os trâmites de uma campanha dita tradicional, sendo que a solução foi uma solução criativa. Perante o desafio que o cliente nos tinha colocado, foi uma solução absolutamente lógica.
Há uma coisa extremamente importante em relação aos clientes que trabalham connosco e tem de lhe ser dado esse mérito – é que trabalhamos com clientes que compreendem o processo de comunicação.
Acontece não só com a Mercedes, como aconteceu com outros clientes, como o BES e a campanha da Esperança, que foi um formato não convencional para uma campanha institucional de um banco.
O cliente é fundamental. Sobretudo quando se mantém a agenda no cliente do cliente. Todos os briefings têm muitas agendas. É muito importante que percebamos que os clientes dos clientes são os nossos clientes. Não podemos esquecer que a comunicação não se estabelece entre empresas, mas entre pessoas. São os cidadãos, os consumidores aqueles a quem queremos chegar, com quem queremos falar. Sem essa ambição de querer ter sucesso no público é praticamente impossível termos campanhas que sejam faladas e conhecidas. Muitas vezes ficam-se pelos meandros do “publicitez” e do “marketez” e isso não nos interessa, não é a escola BBDO.
Briefing | Disse que o sucesso da campanha para a Mercedes colocou a fasquia onde ela deve estar. Mas como se inova a partir daqui, como se continua a surpreender?
RS | A Mercedes é uma marca fantástica, que é inovadora de per se. O que vamos fazer é tentar dar visibilidade a esse trabalho. É uma marca que não procura mais do mesmo e nós temos a ambição de trazer projetos tão bons como este.
Temos uma ótima relação com o cliente local e, neste momento, já uma boa relação com a Mercedes em Estugarda. É óbvio que o trabalho de qualidade, com um custo-benefício que é muito rentável para o cliente e muito baseado na verdade da marca nos abriu espaço de diálogo e capacidade para chegar a centros de decisão internacionais. Estamos a fazer esse projeto e já participámos num briefing com cerca de 60 agências de todo o mundo. O nosso projeto ficou em segundo lugar e estamos ainda em discussão para saber se vai avançar.
Tal como a Mercedes, acreditamos que não se deve pensar de forma periférica, que as ideias não têm de ser periféricas e que nem tudo depende do orçamento, depende do talento.
Briefing | Os resultados de 2014 melhoraram o rating na rede BBDO?
RS | Temos uma boa cotação dentro da rede. A BBDO tem-nos incentivado e premiado a nossa forma de estar. Recusamo-nos a ser periféricos. As ideias não têm limites geográficos. Tudo depende da forma como nos levantamos para trabalhar e de qual a missão que temos à frente. Não temos é de nos sentir pequenos por vivermos neste canto.
Briefing | Mas o mercado é pequeno…
RS | É e isso condiciona. Mas nada melhor do que ter ideias porque boas ideias nem sempre dependem de grandes produções. É muito importante, sobretudo em mercados como o nosso, em que não podemos estar à espera de grandes produções para enchermos o olho, tentar ter grandes conceitos, grandes ideias para encher os corações. Não temos nada de pensar de forma periférica, antes pelo contrário. Hoje fala-se tanto de criativos portugueses que estão pelo mundo, o talento português é mais do que reconhecido internacionalmente, mas, muitas vezes, essas pessoas passaram anos a trabalhar em Portugal e nunca tiveram essa visibilidade. O que, na verdade, não nos diz muito sobre o talento português, mas sobre as nossas estruturas e sobre o contexto em que as nossas estruturas funcionam. Há qualquer coisa de estrutural em nós, no mercado, na cultura que nos faz desaproveitar recursos, quando podíamos ter outro tipo de mais-valias. É um problema nosso, porque temos muitas agendas dentro das agendas.
Briefing | O que são essas agendas dentro das agendas?
RS | Isso leva-nos à conversa anterior, ao deixarmos de nos questionar. Esse deve ser um compromisso connosco. Essas agendas têm muito a ver com a forma como se encara o quotidiano, os desafios que achamos que devemos colocar a nós próprios e aos outros, se devemos ou não questionar o que estamos a fazer. Isso tem de ser feito diariamente, sobretudo quando se trabalha em indústrias criativas. Há um problema cultural que nos faz confundir o prestar serviços com ser servil. Temos muito a cultura do yes man. Nas agências que se dizem criativas temos a obrigação desse estímulo, temos de defender as nossas convicções e, para termos convicção, devemos levar ao cliente coisas que são certas e que sabemos por que são certas. O que não devemos é fechar processos apenas por fechar processos, para que seja mais um trabalho feito. Devemos, sim, fazer trabalho que nos prestigie enquanto criadores de conteúdo e criadores de interesse. Essas agendas paralelas existem nos departamentos criativos, nos departamentos de contacto, nos departamentos de marketing. Toda a gente tem agendas no seu quotidiano, muito baseadas nas suas rotinas.
Briefing | Quando fala no fechar processos apenas por fechar processos, está também a dizer que se arrisca pouco?
RS | Não sei se risco é a expressão certa. Ousamos pouco e, às vezes, acho que ousamos mal. O fazer diferente não é necessariamente fazer maluco ou fazer diferente por fazer diferente. Não é essa a questão. Mas, de facto, há poucos trabalhos que sejam marcantes, não para a nossa indústria, mas para o cidadão, para as pessoas que veem o nosso trabalho. Acho que o que se tem produzido em Portugal é um bocadinho paisagem. Há pouco risco, há muitas coisas feitas para circuito interno. Não vemos aí qualquer tipo de mais-valia. A BBDO não produz, por exemplo, para os prémios.