Em criança, Fred Oliveira trocava os carrinhos por tubos ou folhas de papel, que enrolava para simular uma lente. Se, na altura, longe estava o pensamento de ser realizador, esse tornou-se mais óbvio quando uma tia lhe ofereceu uma câmara de filmar. Tinha uns 14 anos e “filmava tudo o que mexesse”. A escolha pelo curso de Cinema e Vídeo na Escola Superior Artística do Porto, que começou em 2002, foi, pois, evidente.
A realização surgiu porque era “deslumbrado e um fascinado contador das histórias dos outros”, diz. A publicidade, essa, apareceu na sua vida já no fim do curso, graças a um convite da Krypton, onde permanece até hoje. “Estava no curso certo, na escola certa e com as pessoas certas”, garante. Foi ainda em 2002 que realizou para a TMN, “Beijo – Mais perto do que é importante“, com a EuroRscg, o primeiro filme de uma carreira que lhe valeu reconhecimentos no New York Festivals, nos Epica Awards, no El Ojo e noutros festivais nacionais e internacionais. Neste percurso, destaca “Doctor”, para a AMCV, com “um poderoso script” da Fuel e talvez porque tenha sido finalista em Cannes Lions. Ou o que filmou para o Queer Lisboa: “Welcome“. “O filme nasceu de um copy incrível do Marcelo Lourenço e do Pedro Bexiga e uma folha em branco de cenas, e resultou num orgulhoso manifesto LGBT a preto e branco”, comenta. Noutro prisma, salienta o que fez na Turquia, para a Arçelik, “With your love – Turkey”, numa aventureira produção de um mês com a Norr films. “Na mesma semana num dos dez voos entre filmagens, tivemos fogo na cabine, uma aterragem de emergência, um tornado, um terramoto e o filme a contar 12M de views numa semana… vou-me lá esquecer disto!”
Da sua memória também não desaparece o primeiro filme que fez para a Ford “Wingman” com a Ogilvy Istambul. Talvez porque foi o seu primeiro filme de carros e porque foram precisos dois meses de trabalho para o design do filme, que implicou a construção de uma casa inspirada no Ford Focus em dois estúdios.
Esta foi, aliás, uma das muitas produções internacionais que tem assinado e que tornou a Turquia na sua segunda casa. “Tenho com a Norr Films e o mercado turco uma relação muito próxima e familiar… por isso vivo muito entre Lisboa e Istambul”, conta.
Seja em Portugal, ou no estrangeiro, o ritual antes de começar um filme é sempre o mesmo: representa todas as personagens da cena e, depois, em filmagens, coloca os AirPods, e dirige “a orquestra”. Assumindo-se como um “bicho de palco”, defende que um realizador de publicidade deve ser um apaixonado em 30 segundos. Além disso, ser estético, contar uma história como a sente e não como a lê e acreditar nas personagens são bons pontos de partida. Essencial, sugere, é fazer das PPM [reuniões de pré-produção] o palco do filme. É nelas que começa o seu palco. “Depois é contar uma história mesmo quando não existe história e dirigir a cena mesmo quando não tens atores”. Não diferencia, porém, a lente do cinema da da publicidade: “Não consigo dissociar uma da outra ou provavelmente não sei mesmo”.
Assumindo-se como um homem de palco e representando as personagens do filme antes de começar a filmar, saltar para a frente das câmaras é uma possibilidade? Talvez, responde. Mas, para já, diz, está mais focado na realização. “Não sei se aguentava a pressão de dois papéis”, nota.
Do que gosta é de um “bom desafio, de criar laços, de traçar caminhos”. A experiência com marcas como a Vodafone, o Continente ou a Ford são reflexo de trabalhos que caracteriza como desafiantes, gratificantes e de continuidade. Em comum têm o storytelling. É, aliás, com todas as marcas que o têm no ADN que gostaria de trabalhar. Quanto a filmes, realça o desejo de ter realizado todos os storytellings que não ganhou em pitch ou o, bem antigo, mas de que ainda se lembra bem: “Everyday she melts my heart ́ ́, “que é muito mais do que ‘aquele momento’”. Admite, “claro”, que gostava de já ter na carteira filmes para a Nike ou para a John Lewis. São os detalhes que raramente “temos o prazer de ver num anúncio” que o deixam rendido, e não a espetacularidade. É o caso do filme do Vince Squibb, com a Lowe London e a Gorgeous, para a Nestlé Baci, em 2004. “Um café, duas personagens, o mesmo café e o mesmo chocolate. Simples, parece… nota-se a excelência na representação, a elegância na direção e onde encaixa e muito bem a Nuvole Bianche, do Ludovico Einaudi”.
Sofia Dutra