O Ricardo gosta do atrevimento das marcas

O Ricardo gosta do atrevimento das marcasRicardo Pereira começou há 20 anos na moda e hoje faz teatro, cinema e televisão em Portugal, no Brasil e, mais recentemente, em França. Concilia a arte com a publicidade, tendo já participado em mais de 90 anúncios, alguns para marcas globais como a Seat.

Gosta de relações duradouras com as marcas, tal como gosta do atrevimento de marcas novas. E gosta sobretudo de ver as marcas presentes nas produções artísticas, porque essa presença é garantia de continuidade dos projetos. “Mar Salgado”, a novela da SIC que protagoniza atualmente, é, a esse respeito, um fenómeno.

Briefing | Além de ator e apresentador, também é protagonista de campanhas publicitárias. Como gere essa sua faceta?

Ricardo Pereira |  Quando estou associado a uma marca e a fazer uma campanha, seja ela fotografada, seja de vídeo, seja de voz, procuro sempre perceber o objetivo da campanha, o posicionamento da marca. E, obviamente, na minha versatilidade enquanto ator, e não só como um nome ou um rosto, procuro ir ao encontro dos valores da marca, de como quer chegar ao público.

Há, claro, uma preocupação na escolha dos produtos que comunico e hoje vou a menos castings, porque as marcas me procuram pelo trabalho que tenho vindo a desenvolver, são solicitações muito mais diretas. Mas aprendi que conquistar um cliente começa logo na apresentação que fazemos num casting. Temos uma folha à frente com o nosso nome, a nossa altura e a nossa idade e não nos devemos baixar para largar a folha, devemos largá-la, porque só temos um minuto para aparecer e não o podemos desperdiçar. São ensinamentos que fazem parte da minha génese enquanto trabalhador no mundo da moda e, depois, da minha vida como ator e apresentador. São regras básicas, que se desdobram noutras que vamos aprendendo ao longo do tempo, mas que fazem com que as marcas acreditem e confiem porque sabem que se associaram a uma pessoa que vai desempenhar o trabalho com rigor e profissionalismo. É uma característica que me imponho permanentemente.

Tenho relações com marcas de muitos anos, algumas há mais de dez, o que funciona, porque acabamos por crescer juntos. Gosto que prevaleça uma relação longa e duradoura. É sinal de que estamos no bom caminho a todos os níveis. É sinal de que eles acertaram em quem escolheram e de que eu também acertei na marca com que estou a colaborar.

Briefing | O que o faz associar-se a uma marca?

RP | A marca em si. Perceber a história, o percurso, os valores, o que me poderá acrescentar e o que poderei acrescentar à marca. Até pode ser um produto que nunca me tenha imaginado a comunicar, mas, se a campanha tiver atrevimento suficiente, se me obrigar a chegar onde nunca tinha chegado, a experimentar um novo registo, aceito o desafio. Não tem necessariamente de ser uma marca com anos de vida, porque há marcas novíssimas que percebemos logo que são projetos vencedores. Tem a ver com para onde a marca quer caminhar. E para onde nós queremos ir. Por isso é que é importante, numa reunião inicial com a marca, perspetivar os nossos próximos anos de trabalho. Esse é um cuidado que temos no agenciamento artístico. Planificamos sempre um ano, um meio e meio à frente. E quando se apresenta esse planeamento, a marca percebe o caminho que estamos a construir ou a solidificar e isso transmite confiança.

Não são só os valores, até porque as marcas vão ter com as pessoas que acham que correspondem aos seus valores. Gosto de sentir que as marcas têm ideias fora da caixa e que vão ter com pessoas que não são as mais óbvias. A experiência tem-me dito que só corre bem. Quando comunico marcas em que o público via outra pessoa a fazer, em que a imagem a que estão habituados é desconstruída, corre maravilhosamente bem. Mas, para isso, é preciso ter bons criativos, ter pensadores das marcas e das campanhas que queiram arriscar e que, com o arriscar, tragam diferença, tragam expectativa.

Briefing | E o que, pelo contrário, o faz rejeitar uma marca ou uma campanha?

RP | Não estamos aqui a falar em questões monetárias, porque, obviamente, há momentos na vida em que temos de pesar muitas situações. Nós, artistas, vivemos de nós próprios, do que podemos dar. Na minha carreira, em primeiro lugar está a parte artística. O meu lado comercial é consequência do trabalho enquanto ator. E tanto eu como as pessoas que trabalham comigo sabemos que o meu bom desempenho, seja no teatro, no cinema ou na televisão, seja como ator ou apresentador, vai significar relações comerciais mais duradouras ou relações novas. A nossa preocupação é trabalhar bem. A consequência disso aparece e analisamos, mas nunca vamos pelo caminho mais fácil, não nos vendemos ao que, aparentemente, é mais fácil mas que, no futuro, nos poderá catalogar ou direcionar a carreira para onde não queremos ir.

Então o que me pode levar a dizer que não faz sentido estar associado a uma marca? Sou muito claro. Se essa marca vai contra aquilo que perspetivámos para a minha carreira ou se o trabalho artístico que estou a fazer num dado momento pode descredibilizar a campanha ou se, pelo contrário, a campanha pode afetar a imagem do que estou a fazer artisticamente.

Briefing | Sendo ator, sente-se tentado a improvisar a partir da ideia criativa?

RP | É muito complicado improvisar. Há pessoas que são pagas para escrever e nós temos de respeitar. É como quando nos dão um texto original para uma novela ou cinema. Podemos, de certa forma, expor uma situação e, às vezes, essa exposição tem efeito, porque pode tocar num ponto em que o autor não tinha pensado. Mas eu tento respeitar o trabalho de cada um. Ao rosto final do projeto, pode haver coisas que não façam sentido, mas que fazem para a marca, para o produto. É importante ter uma ideia do todo.

Eu tenho algum contacto com o mundo da publicidade, até porque tenho vários amigos em agências com quem partilho ideias. Já fiz vários personagens que têm a ver com publicidade e neste momento estou a fazer uma novela em que sou dono de uma empresa que cria jogos e aplicações. Estagiei numa empresa na LX Factory e procurou estar sempre informado. Esse conhecimento permite trocar ideias com o cliente e com o criativo, às vezes dando a oportunidade de verem outra coisa com as palavras que escreveram. Estamos ali para oferecer conteúdo diferenciado e não apenas para a nossa cara aparecer. Tenho de dar algo mais e não mais do mesmo.

Briefing | É inevitável um ator passar para o mundo da publicidade?

RP | Quanto a mim, é inevitável. Um ator tem de ser versátil ao ponto de entender que, na sua carreira artística, pode circular entre o cinema, o teatro, a televisão, a locução, a dobragem, a apresentação. São disciplinas que promovem uma maturidade muito grande enquanto artista, porque comunica para públicos diferentes. São experiências totalmente diferentes. Há 15 anos, fechavam-me numa sala a fazer National Geographic e adorava, deu-me um traquejo de vida, de responsabilidade, de entendimento e de dedicação ao trabalho brutal. Acho que o ator deve ter um outro mundo. E deve aproveitar o da publicidade, não só para ganhar dinheiro, mas para exercitar uma outra forma de comunicação. Claro que há atores que se sentem mais à vontade, outros que são mais reservados, há atores que são mais solicitados do que outros. Mas, se me perguntar, eu acho que há uma possibilidade de o artista, sem prejudicar a sua carreira artística, ser uma figura que comunica produtos.

Briefing | A atratividade das marcas pelos atores limita-se praticamente aos das novelas. O teatro não é a atrativo?

RP | Há dois anos, produzi a minha primeira peça. Foi uma coprodução entre Portugal e o Brasil, com uma produtora brasileira com a qual já tinha trabalhado. Esse projeto teve de tudo – teve público (foi a peça mais vista do ano em Portugal), teve receita de bilheteira, teve patrocinadores, teve impacto mediático. No final do projeto, quando apresentámos os resultados às marcas – o que é atípico, sobretudo em teatro – todas as marcas disseram que queriam estar connosco no próximo projeto. É a prova de que é possível fazer do teatro uma forma de comunicar com sucesso e de que é possível pedir às marcas para estarem presentes. O que é preciso é apresentar um projeto viável. Porque há marcas que estão disponíveis. Esta interação com as marcas ajuda a ter salas cheias e ajuda a que as marcas apoiem algumas figuras do teatro, não só da televisão. Para a marca, significa que tem um mega ator, embora se calhar não um rosto tão conhecido do grande público. Mas hoje em dia o mercado está tão alargado e com uma dinâmica tão boa que quase todos os atores estão a circular também pela televisão. O que as marcas procuram são rostos conhecidos, cujo percurso de alguma forma tenha a ver com o perfil da marca e que tenham bom nível de comunicação, que cheguem ao público que a marca quer alcançar com uma boa dose de notoriedade. Acho que as marcas se sabem posicionar muito bem e escolhem muito bem. Há abertura do mercado para escolherem rostos de uma forma contínua, a uma escala maior.

Esta entrevista pode ser lida na íntegra na edição impressa do Briefing.

fs@briefing.pt

Segunda-feira, 13 Julho 2015 11:56


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