A opinião de… Filipe Russo, do Piaget

O coordenador de Comunicação e Marketing do Piaget dá a sua visão sobre a importância da coerência, autenticidade e neurociência na construção de marcas.

Vivemos num tempo em que comunicar é um dos maiores desafios das organizações. A atenção tornou-se o ativo mais disputado do mercado. A cada segundo somos expostos a centenas de estímulos visuais e verbais, cuidadosamente desenhados para captar microsegundos de foco. Neste contexto saturado, a questão já não é “como comunicar”, mas “como ser percebido, lembrado e desejado”.

A comunicação moderna não se resume a estética ou presença digital. É neurociência aplicada à perceção. Cada cor, cada forma, cada palavra ativa áreas específicas do cérebro ligadas à emoção, à memória e à decisão. Os estudos de neuromarketing demonstram que 90% das decisões humanas de consumo são tomadas de forma inconsciente. Por isso, comunicar é, antes de tudo, compreender a mente humana, saber que tons geram confiança, que contrastes despertam atenção e que palavras criam afinidade emocional.

A coerência tornou-se um fator competitivo. As organizações que compreendem a psicologia das cores, a semântica das palavras e a cadência visual das suas mensagens constroem marcas mais fortes, porque falam ao inconsciente coletivo antes de o fazerem à razão. A consistência dos estímulos visuais, da tipografia ao enquadramento cromático cria familiaridade, e a familiaridade gera segurança. É por isso que a comunicação não é um ato criativo isolado, mas um sistema de perceções que deve ser pensado com precisão.

Mas a técnica, por si só, não basta. As pessoas reconhecem autenticidade quando ela existe e reagem instantaneamente quando não existe. O público de hoje é informado, impaciente e emocionalmente treinado para detetar o artifício. As marcas e instituições precisam de alinhar o que dizem com o que fazem, de transformar valores em experiências, e de substituir o ruído pela clareza.

A linguagem é, neste contexto, o instrumento mais poderoso. Palavras transportam intenções, moldam perceções e constroem realidades. Um verbo mal escolhido pode distorcer a mensagem tanto quanto uma cor fora de tom. A comunicação exige, por isso, uma gramática de consistência: o mesmo tom, a mesma energia e o mesmo significado em cada gesto, em cada frase e em cada detalhe visual.

O futuro da comunicação não será dominado por quem fala mais alto, mas por quem fala com mais propósito. As organizações vencedoras serão as que souberem conjugar técnica, sensibilidade e visão, capazes de criar estímulos coerentes, experiências memoráveis e relações emocionais duradouras.

Comunicar é, hoje, um exercício de precisão emocional. Um equilíbrio entre ciência e intuição, estratégia e autenticidade. E é aí, nesse território exigente e fascinante, que se constrói o verdadeiro valor de uma marca e de quem tem a responsabilidade de a fazer ouvir.

Eis três exemplos representativos do poder da comunicação coerente na diferenciação entre marcas:

Delta Cafés — Um caso paradigmático de coerência emocional e estratégica. A marca fala de portugalidade, proximidade e valores humanos — e pratica-os em tudo: na publicidade, na cultura interna, nas relações com produtores e no tom das campanhas. O discurso coincide com a experiência. Quando todos falam, a Delta continua a emocionar porque é autêntica;

The Navigator Company — Um exemplo de consistência visual e conceptual. As suas campanhas integram sustentabilidade, inovação e responsabilidade ambiental num discurso que se prolonga até ao produto e à forma como comunica com investidores e sociedade. A coerência entre o propósito e a narrativa reforça a credibilidade;

Farfetch (na sua génese portuguesa) — Demonstra como o design, a linguagem e a experiência digital se alinham numa só identidade. A marca comunica luxo, tecnologia e globalização sem nunca trair o ADN criativo que a originou. Coerência estética e conceptual aplicada ao digital.

Filipe Russo, coordenador de Comunicação e Marketing do Piaget

Segunda-feira, 27 Outubro 2025 13:46


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