Briefing | A Keller Williams (KW) completa, em setembro deste ano, uma década no mercado português. Que balanço faz deste percurso?
Marco Tairum | É um balanço superpositivo. Na última convenção anual, os sócios fundadores em Portugal, Nuno Ascensão e Eduardo Garcia e Costa, utilizaram uma frase que resume bem a nossa perspetiva sobre estes dez anos: orgulhosos, mas não satisfeitos.
Orgulhosos porque foram anos de crescimento extraordinário, em que atingimos muitas das metas a que nos tínhamos proposto. Quando nos comparamos com o mercado, somos neste momento a terceira maior rede imobiliária a nível de consultores em Portugal.
Desde o início, há uma palavra que nos norteia e vai continuar a nortear: crescimento. E isso tem a ver com o nosso modelo de negócio, que importámos dos Estados Unidos. A KW Portugal faz parte de um ecossistema muito maior, a KW Internacional, que tem 42 anos de presença no mercado e é líder a nível mundial. A proposta foi trazer para Portugal, não só a marca, mas, mais importante, os modelos e sistemas que estiveram por trás do sucesso nos Estados Unidos. E estes dez anos orgulham-nos muito porque sentimos que, efetivamente, trouxemos para Portugal os principais pilares da proposta de valor da KW. E só assim é que conseguimos fazer este caminho. Se tivéssemos tentado improvisar a nossa versão da KW não teríamos tido a capacidade de chegar onde chegámos.
A nossa definição de modelo é uma forma de chegar ao sucesso comprovado, independentemente do sítio ou da pessoa que o implementa. A KW é uma empresa especializada em desenhar modelos e sistemas de sucesso, que utilizou para chegar à liderança de mercado mais competitivo, que são os Estados Unidos, e depois conseguiu fazê-lo a nível mundial. Se, nos últimos dez anos, estivéssemos aqui a reinventar a roda teria sido uma oportunidade perdida.
Chegámos ao final destes primeiros dez anos no top 3 em número de consultores, o que significa que temos, hoje em dia, três mil consultores, trinta operações de norte a sul do País e na Madeira – a nossa operação na Madeira, inclusivamente, é a maior a nível nacional. Temo-nos expandido no território de uma forma consolidada.
Naquilo que é a nossa principal missão, que é ajudar os nossos consultores a construir carreiras que vale a pena ter, negócios que vale a pena deter e vidas que vale a pena viver, também aí sentimos que estamos a fazer o caminho a que nos tínhamos proposto. Celebrámos o facto de termos a primeira equipa a chegar ao Millionaire Real Estate Agent, um marco importante, porque uma das bases da KW é o livro com esse título escrito pelo Gary Keller, um dos nossos fundadores e atual CEO, e que inclui as melhores práticas para quem quiser construir um negócio milionário. Isso acontecer quando celebramos dez anos é uma feliz coincidência. Os resultados da rede são importantes, a nossa dimensão também, mas, se tivéssemos alcançado esses números sem conseguir servir e ajudar quem verdadeiramente interessa, que são os nossos consultores, as coisas teriam sido em vão. Haveria dissonância entre o que dizemos e o que fazemos.
Mas, também dizemos que não estamos satisfeitos, porque, com todo este potencial que temos ao nosso dispor, o terceiro lugar ainda sabe a pouco. Provavelmente estamos a dez por cento de trazer todo o potencial destes modelos e sistemas para Portugal. Temos muito claro qual é o nosso caminho e como o vamos fazer.
São terceiros no mercado em número de consultores. É essa a métrica do sucesso de uma rede imobiliária?
Vou dizer que sim por duas razões fundamentais. A primeira é porque, em Portugal, estamos num mercado que não é regulado, pelo que se torna difícil fazer a avaliação real de outros indicadores, pelo menos para efeitos comparativos. É que qualquer indicador que esteja publicamente disponível é informação que as empresas partilham no mercado, seja volume de vendas, faturação ou transações. Por isso, toda a avaliação tem de ser feita com algum cuidado. Já o número de consultores, mesmo continuando a ser disponibilizado pelas próprias empresas, acaba por ser a forma mais fidedigna de conseguirmos fazer esta comparação.
Ao mesmo tempo, quando olhamos para o nosso modelo de negócio, sabemos que o número de consultores é, como costumamos dizer, o primeiro dominó: quanto mais consultores tivermos mais angariações são feitas, quanto mais angariações forem feitas mais transações serão efetuadas e as transações resultam em faturação. É, portanto, a primeira métrica. Isso é particularmente relevante especificamente em Portugal, porque o nosso modelo de remuneração dos consultores é muito diferenciador. É que, a partir de um determinado patamar, aquilo que os market centers ganham por consultor está limitado. E quando isso acontece a forma de maximizar a rentabilidade passa por aumentar o número de consultores, o que significa que o nosso modelo de negócio depende de escala. Com a vantagem de que não trabalhamos com margens tão baixas como as do mercado americano, o que gera uma maior oportunidade de rentabilidade. Vemos isso a acontecer. Quando comparamos com as outras redes, têm, em média, entre 15 a 20 consultores por agência, e nós temos 80, em média. É, pois, um dos indicadores que revela a nossa aposta em economia de escala.
O modelo foi importado e, como disse, sem margens para improvisos. Ainda assim, foram feitas adaptações ao mercado nacional?
Claro que sim. Modelos e sistemas não são regras e procedimentos. É uma distinção que fazemos. São um guião. O que importámos foram modelos e sistemas, na base dos quais estão os princípios de gestão que levaram a KW a ser líder. E, depois, fizemos a localização, o que passa por termos o modelo de remuneração mais competitivo do mercado.
Acreditamos que o setor da mediação imobiliária é um negócio relacional. Que, como proprietários, quando entregamos a nossa casa a alguém, para a vender, o fazemos por recomendação. Se o negócio é relacional, a marca mais importante não é a da rede, é a do consultor. E por isso temos de ter um modelo de remuneração que ajude o consultor a financiar a construção da sua marca. Importa aqui dizer também que Portugal, e mesmo quando olhamos para as outras grandes redes, tem, de facto, um ambiente propicio para a implementação das redes americanas. Há uma maior simplicidade que faz um bom paralelismo com a realidade americana. Dou um exemplo prático: na Bélgica, o consultor tem de ter um contrato de trabalho com a agência, o que, tendo em conta que este setor é maioritariamente comissionista, contribui para esmagar as margens e, portanto, a mediação imobiliária tem tido maiores dificuldades em implementar-se. É por isso que acontece, muitas vezes, Portugal ser, fora dos Estados Unidos e do Canadá, o país número um.
Além do modelo de negócio, o que diferencia a KW?
São os principais pilares da nossa proposta de valor. A KW apresenta-se como uma empresa de formação, coaching e tecnologia especializada na mediação imobiliária e isso reflete muito o dia a dia das nossas operações. O facto de dizermos, em último, que atua no setor imobiliário não quer dizer que seja a parte menos importante. Não. Estamos aqui para termos sucesso no setor e ensinar as nossas pessoas a serem os melhores consultores imobiliários. A forma como nos propomos chegar lá é que é diferenciadora. O coração da KW é a sala de formação. Temos um volume de know how que está consolidado, transformado em modelos e sistemas, simplificado para que qualquer pessoa possa aplicar no dia a dia, o que, de facto, nos distingue.
A nossa proposta de valor assenta na formação, que está ligada à nossa missão – construir vidas, carreiras, negócios que vale a pena ter. Ou seja, a nossa formação não se resume à formação prática de como angariar, promover e vender um imóvel. Temos de ter a capacidade de ensinar os consultores a serem líderes em cada uma destas áreas, pelo que temos formação mais prática, comercial, mas também sobre construir equipas, construir rendimento passivo, construir riqueza.
E, depois, temos o coaching. A formação trabalha skills e o coaching trabalha mindset, porque as pessoas têm de ter o mindset correto para fazer as atividades certas. O que se expande, pois, para todas as dimensões da pessoa: melhores líderes nos seus negócios, nas suas carreiras, mas também nas suas vidas. É o reflexo ao mais alto nível da forma como definimos a liderança: ensinar as pessoas a pensar.
E onde entra a tecnologia neste negócio?
É absolutamente fundamental na nossa perspetiva. Mais uma vez, tem a ver com a nossa abordagem ao negócio. Nós acreditamos que o sucesso está na relação, em termos a capacidade de encontrar pessoas que queiram estar em relação connosco, em mantermo-nos em contacto com essas pessoas e depois, por via dessa relação de confiança, escolherem-nos para serem o seu consultor imobiliário. Como é se faz isto? Através da gestão de uma base de dados. Não nos focamos só em garantir que a angariação é imediatamente transacionada, ensinamos os nossos consultores a manterem-se em relação com os clientes, desde o primeiro momento em que contactam com eles até ao dia em que vendem a casa e depois o dia em que decidem voltar a trocar de casa. Sabemos que as pessoas tomam a decisão de mudar de casa em ciclos de sete a dez anos, pelo que são várias oportunidades de negócio. Por isso, gerir a base de dados é fundamental. Mas, numa operação em escada, só é possível com tecnologia. Somos a única rede cuja tecnologia é proprietária, foi desenvolvida internamente, de forma a implementar as boas praticas do The Millionaire Real Estate Agent.
Este ano, a nossa grande aposta é uma plataforma integrada em que a parte transacional e a parte relacional dos nossos consultores possam coexistir. Não acreditamos que a tecnologia, a prazo, vá substituir o consultor, mas acreditamos que o consultor, corretamente servido por tecnologia, vai ter uma vantagem competitiva. Costumamos falar nos três pilares em que o consultor tem de trabalhar – Leads, Listing, Leverage. E a tecnologia é a primeira pedra de alavancagem do negócio.
A KW Portugal prepara-se para importar a MAPS Coaching, a divisão de coaching de alta performance do grupo. Como vai alavancar o negócio?
A MAPS Coaching tem duas vertentes principais. Uma delas é a vertente do coaching, individual ou em grupo, e outra é o BOLD, programas de condicionamento comercial. Esta foi, aliás, a primeira ferramenta que importámos: tem a duração de sete semanas e os consultores que a frequentam aumentam exponencialmente os seus resultados.
Este programa foi lançado em 2008 como resposta a um repto do CEO durante a crise de subprime nos Estados Unidos: como é que ajudamos os nossos consultores a passar por isso. Na certeza de que tudo começa na forma de pensar, foi desenhado este programa foi desenhado para trabalhar o mindset dos consultores. E a KW alcançou a liderança do mercado em 2013.
Ora, acreditamos que estamos a viver este momento em Portugal. Acabamos de sair da primeira grande inversão de ciclo desde a última crise – convivemos com a pandemia, em que houve um primeiro período de queda, mas depois uma aceleração gigantesca que, inclusivamente, compensou, e a mediação, como um todo, conheceu em 2021 e 2022 os seus melhores anos. Já 2023 foi o maior ano de decréscimo de transações imobiliárias desde 2014, mas a KW não quebrou, mantivemos o volume de faturação. E considerámos que era o momento perfeito para acrescentar a totalidade da proposta de valor da MAPS Coaching.
A propósito do desempenho, o que explica os resultados de 2023, em contraciclo com o mercado?
No último trimestre de 2022, o mercado começa a desacelerar, mas o ano ainda acabou a crescer – aliás, para o setor como um todo, foi o melhor de sempre. E na KW surfámos essa onda, tendo crescido 35%, o que foi a maior taxa de crescimento entre os grandes players do setor. Em 2023, o mercado, que já tinha dado sinais, quebra efetivamente, uma quebra muito forte nos dois primeiros trimestres, que começa a ser compensada no final do ano, mas, ainda assim, o último trimestre acabou por ser o segundo pior trimestre do ano em número de transações. Mas, na KW foi o melhor trimestre de sempre, tendo terminado o ano com os resultados em linha com 2022. Voltámos a ter o melhor ano de sempre, digamos assim. Aqui num contexto de que, confesso, me orgulho muito mais. Porque se, em 2022, tivemos o melhor ano de sempre, mas o mercado também teve, portanto acompanhámos a tendência, em 2023 estivemos em contraciclo: o mercado quebra 20%, só não foi mais porque houve uma grande subida de preços e, por isso, quando olhamos para o valor, a quebra foi de apenas, com muitas aspas, 12%. Conseguir manter a nossa performance nesse contexto ainda nos encheu mais de orgulho. Fechamos o primeiro semestre a crescer em faturação 20% (face ao mesmo período de 2023).
Como é que estamos a fazer isto? Volto à resposta de há pouco sobre o principal pilar da nossa proposta de valor: a formação. Estamos há muito tempo a preparar os nossos consultores para esta mudança. A única certeza que temos sobre ciclos é que tudo o que sobe um dia desce. E, a partir de 2013, vivemos anos de subida, pelo que, um dia, iria descer. Em 2018, traduzimos para português outro livro do Gary Kelly, livro “Shift”, cujo subtítulo é “Como os melhores consultores imobiliários enfrentam tempos difíceis”. Trata-se de uma compilação das melhores práticas dos melhores consultores, que se transformam em modelos e sistemas que podem ser aplicados por qualquer um. Por isso, quando o momento chegou estávamos preparados, do ponto de vista do mindset e das ferramentas, para garantir que os consultores conseguiam prosperar num mercado mais adverso. E foi exatamente isso que aconteceu.
Recuperando a sua primeira resposta. Disse que a KW Portugal tem muito claro qual é o caminho. Qual é e como se propõe lá chegar?
O “para onde” vai ser uma consequência do “como”. E o “como” é mantermo-nos fiéis à nossa missão de construirmos carreiras, negócios e vidas que vale a pena ter. Se, através da formação, do coaching e da tecnologia, ajudarmos as nossas pessoas a serem líderes nas vidas, nas carreiras e nos negócios, elas vão crescer e, se crescerem, nós crescemos. Se continuarmos a crescer ao ritmo a que temos crescido e, sobretudo, acima do mercado e dos nossos principais concorrentes, não como meta, mas como consequência do que estamos a fazer, chegaremos à liderança do mercado.