As marcas não são coisas estanques. Mesmo as mais antigas e com mais tradição têm de saber crescer, evoluir e mudar ou, inevitavelmente, enfrentar o seu fim, por muito grandes que tenham sido. Ainda recentemente testemunhámos o fim da Tupperware, um gigante que definiu toda uma categoria de produtos, ou, há uns anos, da Blockbuster, apenas para citar dois exemplos grandes, que não se conseguiram adaptar às novas realidades dos seus mercados.
E se isso pode acontecer a empresas desta dimensão, o que fará com empresas mais pequenas, que não têm a mesma estrutura e disponibilidade financeira para competir com gigantes?
Quando cheguei à Couto, em 2016, deparei-me com a enorme responsabilidade que é estar numa marca com quase 100 anos de história e tão icónica. Lembrava-me de ver os antigos anúncios, de ver a pasta dentífrica em todas as mercearias e de ver gerações da minha família usar os seus três produtos, o Restaurador e o Petróleo Olex e a famosa Pasta Dentífrica Couto.
Com isto vinha uma grande responsabilidade… o legado da marca. Uma espécie de peso nos ombros de quem gere uma empresa e tem sobre si os olhos dos seus clientes, equipa e parceiros. Mas onde muita gente viu um peso, eu, o Sr. Gomes da Silva (meu marido e administrador da marca à época) e a Dra. Cláudia França (diretora técnica), vimos uma oportunidade.
A geração que cresceu com a Couto estava a envelhecer, a isso juntando o crescente número de concorrentes de grandes dimensões e o desaparecimento de muitas tradicionais mercearias de bairro, onde se vendiam os nossos produtos, significava que teríamos de agir, para não perder relevância para as novas gerações.
Em 2017, fizemos um rebranding, pegando na tradicional imagem dos azulejos do Porto como ponto de partida, mantendo as raízes da marca na sua identidade, e depois disso, começámos a expandir o nosso portefólio. Queríamos ser mais do que a pasta dentífrica e o restaurador, por isso, aventurámo-nos a criar produtos em outras áreas dos cuidados pessoais. E do laboratório da Dra. Cláudia saíram muitas novidades: desde um creme para a barba a um aftershave, cremes hidratantes de corpo, mãos ou rosto, os sabonetes, a água de Colónia e até a nossa vela vegan ou os ambientadores. Um sortido diversificado, mas com produtos que não chocavam com a nossa identidade e aquilo a que o nosso cliente está habituado, mas que nos permitiam chegar a novos públicos.
Abrimos também a loja online e uma loja física, lançámos coffrets e aumentámos o investimento em comunicação. Por altura do centenário (2018), a Couto era já uma marca moderna, sem ter perdido a sua identidade nem os seus princípios. O Sr. Gomes da Silva partiu em 2023, decerto orgulhoso da “nova” Couto, que ele mesmo impulsionou com a sua visão de crescimento, hoje tão diferente da que herdou do seu tio, mas simultaneamente tão autêntica, tradicional e fiel a si mesma como antes.
Um legado, uma tradição ou as expetativas que o cliente possa ter de uma marca são importantes e fazem parte da sua identidade. São um fio orientador que a ajuda a saber de onde vem e para onde vai… o que não podemos, nunca, é deixar que esse fio se transforme em amarras que nos impeçam de evoluir ou de crescer.
Alexandra Matos Gomes da Silva, administradora da Couto S.A.