Respeitinho é bom. E eu gosto…

Respeitinho é bom. E eu gosto…Parem as rotativas. Não podemos publicar. E publicaram uma página em branco.

Já aconteceu e deveria acontecer mais vezes, mas, não só lhes falta a coragem, como o público poderá não atingir a verdadeira dimensão de uma página em branco, de um silêncio na rádio ou da ausência de imagens na televisão.

Ao contrário do que se pensa, nem tudo está disponível para os jornalistas. Embora devesse estar. Com excepção para aquilo que possa, deliberada ou notoriamente, prejudicar a integridade física ou moral dos envolvidos, o que impede o desenvolvimento de uma investigação ou que legalmente é impossível noticiar, os factos existem para serem divulgados. O problema não está apenas no silenciamento ou nas consequências desse silêncio. Está também, no tipo de utilização que alguns jornalistas e jornais fazem dos factos a que têm acesso. Da interpretação que o público lhes dá. Calar antes de publicar? As consequências são graves. Mais do que se pensa.

Estou obviamente a falar da providência cautelar que pretende silenciar os órgãos de comunicação social do grupo Cofina. Independentemente do que possamos – ou de como possamos – considerar o Correio da Manhã, das acusações que lhe possamos fazer de mau jornalismo e outras que habitualmente ouvimos, este é, na verdade, o jornal com maior audiência no país. Aplicar a medida a um grupo inteiro?…

Evitar que se publiquem notícias sobre um caso como o de José Sócrates é, no mínimo, ingénuo, porque vai provocar corporativismos uníssonos, estimular o desrespeito pela decisão judicial (porque, na verdade, como crianças que já fomos, todos gostamos de testar os limites…) e junta vozes àquela(s) que silenciaram. Vozes que, provavelmente, de outra forma não se fariam ouvir. Pelo menos, não tão alto.

O jornalismo é um jogo de equilíbrios, difíceis de conjugar: o rigor e as regras do mercado criam uma conflitualidade latente que muitas vezes mistura sensacionalismo e relevância na mesma frase. É inegável o poder dos media na construção da realidade (ou de realidades). É igualmente inegável o poder dos que podem impedir a criação dessa realidade, de acordo com os seus valores e interesses próprios. E se os jornalistas são cada vez mais vistos como profissionais que foram perdendo a noção de rigor, de ética ou com uma autocrítica quase inexistente – não pensar é tentar ignorar o refúgio em que muitos se encontram para escaparem à pressão do politicamente correcto. Ou do incómodo ao poder. Político ou económico. Em qualquer dos casos, convém evitar incomodá-lo. E porque este se sente incomodado, a estratégia agora é calar antes de publicar. Evitam-se asneiras ou confusões. Mau estar. Chatices de uma democracia saudável na qual as pessoas – ou os jornalistas –falam pelos cotovelos e não têm quem as cale, procurando servir os cidadãos e não tanto as audiências. Coisas que usufruímos sem pensar, como a liberdade de expressão, até nos puxarem o tapete porque estamos a usufruir demais, colocando em causa a própria liberdade de informação, atingindo ainda a inatingível objectividade em função de interesses vários. Ou poucos e poderosos poderes. Eu sei que a moda é cíclica, só não pensei que a história se repetisse tão rapidamente ou que a ideia de repetição se aplicasse também à comunicação social. Afinal, respeitinho é bom. E eu gosto…

Sexta-feira, 30 Outubro 2015 11:32


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