Briefing | Qual é a estratégia subjacente à decisão de adquirir a operação da Pandora em Portugal?
Olivier Kessler-Gay | A Pandora tem 40 anos. Hoje, é uma empresa grande, que vale 3,1 mil milhões de euros. Mas, nem sempre foi assim e há 16 anos optou por entrar em Portugal através da Visão do Tempo. Faz parte da jornada da marca. Nessa altura, não era assim tão conhecida, nem tinha a dimensão que tem hoje, pelo que a estratégia passava por identificar um parceiro que assumisse o risco e investisse no mercado. E nada melhor do que ter um parceiro que conhece o negócio, que conhece a concorrência, sabe quando investir e consegue gerir a equipa de uma forma mais próxima. E investe o seu capital, o que faz uma grande diferença quando a marca é pequena.
A Visão do Tempo fez um trabalho extraordinário. Abriu a primeira loja no Centro Comercial Vasco da Gama e, em cinco ou seis anos, chegou aos 34 pontos de venda. Foi uma grande expansão. Mas, agora, a Pandora é maior internacionalmente, possui uma equipa maior, capacidade em termos de cadeia de abastecimento e mais fundos para investir diretamente.
Entre 2010 [ano da entrada em bolsa] e 2018, verificou-se um espírito empreendedor em todo o lado, mas depois estabilizou. E, em 2019, quando entrou o novo CEO [Alexander Lacik], estávamos a dormir o nosso sono de beleza, mas foi preciso acordar. O que pensámos foi: temos produtos maravilhosos, uma ótima equipa, os clientes adoram a marca, temos de colocar mais energia e investir”. Em menos de um ano, organizámos a empresa, investimos mais em marketing, racionalizámos o portefólio, para o tornar mais claro para o consumidor.
Agora, a estratégia é crescer. E há dois pilares. Um é investir onde somos fortes, não vamos entrar em novos mercados. E somos fortes em Portugal. Temos 34 lojas, uma boa awareness e a brand equity também é boa. Temos fundações sólidas.
Foi por isso que decidimos avançar com a compra da operação.
Este é um movimento que está a acontecer noutros mercados?
Sim, há três anos assumimos o negócio em Espanha, em França há seis anos, em Itália e no Reino Unido, antes. Mais do que isso, investimos diretamente, como está a acontecer nos Estados Unidos, onde estamos a comprar alguns dos franchises.
A Visão do Tempo introduziu a marca em Portugal há 16 anos. Como tem sido o desempenho das lojas?
Tem sido ótimo, porque, final, começou do zero. Em 2021, alcançou os 24 milhões de euros em vendas, apesar da Covid-19. Em 2019, tinha atingido os 35 milhões. É um trabalho extraordinário.
Quais são as expectativas até final do ano, já com o negócio nas mãos da Pandora?
Começámos a pensar nesta mudança há 18 meses, mas não temos pressa. Primeiro, temos de integrar a equipa, ver como as coisas funcionam. Conhecemos a base, temos de ver onde vamos investir.
Em relação à equipa, é uma mudança de cultura, de uma empresa familiar para uma estrutura mais corporativa, pelo que precisamos de tempo para explicar o processo.
Vamos manter a equipa, exceto na logística, porque temos a nossa própria rede e não podemos duplicar as pessoas. Quanto ao resto da equipa, espero que fique feliz com a mudança. Contudo, é verdade que a cultura da Pandora, apesar de ser uma empresa jovem, é diferente. Será uma transição suave, mas, ainda assim, é uma transição.
Em relação à rede, provavelmente temos de investir nas lojas, para ajustar o conceito. Temos boas localizações, mas precisamos pensar onde poderemos expandir as lojas nos próximos tempos, pois temos novas plataformas de produto. Vamos expandir as lojas mais pequenas, porque algumas são mesmo pequenas.
Há planos para novas localizações?
Não muitas, porque já temos 34 lojas, o que é bom. Mas, provavelmente, precisamos de lojas nos centros da cidade, em Lisboa e no Porto, porque temos muitas em centros comerciais. É uma experiência diferente. E o cliente é diferente. Portugal é um país com muitos turistas, que frequentem mais os centros das cidades, pelo que precisamos estar onde estão os consumidores.
E quanto ao conceito, as lojas dos centros das cidades serão diferentes?
Cada loja já é um pouco distinta, devido à oferta de produto, que adaptamos sempre ao cliente potencial. Mas, no final, é o mesmo ADN. Pode reconhecer-se imediatamente a identidade visual da marca.
Que ADN é esse, isto é, qual é a principal mensagem que pretendem transmitir a quem entra numa loja?
Somos um fabricante de joias que quer levar o sonho a todos, isto é, somos um sonho acessível. É muito importante, é aquilo que defendemos, é o nosso propósito. As joias podem ser impressionantes, as pessoas pensam automaticamente que são muito caras, mas temos produtos para todas as bolsas. Não somos uma marca de luxo, queremos ser uma marca acessível. Claro que temos produtos caros, mas o nosso propósito é ser inclusivos e fazer com que os clientes se sintam incluídos.
Mencionou um maior investimento em marketing. Qual é a abordagem?
É uma abordagem global, porque somos uma marca para todos os públicos e precisamos estar visíveis para todos. Somos uma marca para as várias gerações, pelo que temos de ter um marketing 360º. Investimos em televisão, em imprensa, trabalhamos muito com influenciadores. E o digital é cada vez mais importante.
A propósito de influenciadores, há planos para ter um rosto da marca em Portugal?
Ainda não. Em Espanha, temos, em França não. É uma decisão importante, que leva tempo, não queremos cometer erros.
Como explica os resultados do ano passado, apesar da pandemia e das lojas fechadas em muitos períodos?
Em momentos de crise, os consumidores refugiam-se em marcas seguras, que estão há muito tempo no mercado e que têm boa awareness. A Pandora passou muito bem pela crise porque tem fundações muito fortes.
Além disso, como o ciclo de vida é muito longo, as joias são um investimento que se mantém mesmo que, às vezes, se diga que não se gosta mais desta ou daquela joia.
É verdade que estávamos preocupados com o que iria acontecer, mas, o que verificámos é que, no limite, esta é uma marca que está muito ligada às emoções. Quando não se consegue ver ou estar com as pessoas de que se gosta, oferece-se-lhes uma joia. No Dia da Mãe aconteceu, por exemplo. Com a vantagem de ser um produto que não está ligado à moda, não é passageiro. As pessoas ficam com ele e lembram-se daquele momento especial, de quem ofereceu.
Foi um fenómeno muito global.
Em relação ao e-commerce, qual é a aposta?
Vamos fazer um grande investimento na nossa plataforma de e-commerce. Os clientes estão em todo o lado, não sabemos onde começam a sua jornada de compra, pode ser num artigo de revista, numa loja, no site ou numa influenciadora, além de que os veem o produto online podem querer finalizar a experiência na loja.
Temos de ter uma ótima experiência na loja, mas também online, por exemplo, com uma funcionalidade que permite experimentar a joia virtualmente. Vamos igualmente introduzir a ferramenta click & collect, em que as pessoas encomendam online, mas recolhem na loja.
Exige um grande investimento em termos de tecnologia, mas, em meados de setembro, pensamos já ter uma nova plataforma, que será global, mas, obviamente, adaptada a cada mercado.
Do ponto de vista da brand awareness, qual a perceção que os portugueses têm da marca?
Temos uma brand awareness muito boa, segundo os estudos mais recentes. Quando se pede a uma consumidora para identificar quatro marcas de joias, 40% indicam espontaneamente a Pandora, o que é muito bom. E, quando se pergunta se conhecem a Pandora, 95% respondem afirmativamente.
Somos fortes, mas queremos ser mais fortes. É por isso que temos de investir em diferentes plataformas em que possamos mostrar a marca e a sua relação com as emoções.
Isso significa que a Pandora é uma love brand? O que é preciso para se ser uma love brand?
Se tivéssemos a receita… É complexo. Precisamos de reunir todos os ingredientes: temos de ter uma boa manufatura, qualidade elevada, design de qualidade, uma equipa comprometida, o marketing certo e uma experiência na loja e, agora, também online.
E muda de país para país. Há países em que o Dia dos Namorados não tem significado, noutros o Dia da Mãe é muito importante e outros, como os Estados Unidos, dão muito valor ao dia da formatura. Temos de nos adaptar a cada mercado com a mensagem certa.
O que não podemos é comprometer nenhum dos ingredientes. Não se pode comprometer a qualidade, tem de se ser muito exigente com a equipa para que preste o melhor serviço, para que saiba explicar o produto de modo a que as pessoas percebam que as joias têm tudo a ver com emoções.