O que as indústrias criativas podem aprender com Conan Osíris

Conan Osíris, goste-se ou não, é um fenómeno singular que deve ser observado e sobre o qual podemos tirar valiosas lições para a nossa indústria. Lições que muitas vezes já aprendemos mas que tendencialmente vamos esquecendo.

 

#posicionamento: O primeiro ponto, é que não acredito que Conan Osíris, ou Tiago Miranda (nome verdadeiro), seja minimamente ingénuo ou, como ás vezes parece em entrevistas, um cabeça no ar que fala sem pensar muito nas consequências do que está a dizer. Cada detalhe que traz, cada frase que canta, em cada traje que veste, tudo o que faz é pensado, posicionado ao pormenor e quanto a mim de forma altamente distintiva.

#estratégia: Conan consegue unir a sua música a uma espécie de movimento de arte moderna.  Cada aparição de Conan é uma performance artística provocante, desafiadora, que invariavelmente se torna viral e em que muitas vezes os portadores principais da estirpe são os seus maiores críticos. Eu, acho que Conan sabe bem fazer com que isso aconteça, acho que é premeditado. E isso revela consistência estratégica.

O que mais podemos aprender com o Tiago Miranda enquanto criativos? Muito! Algumas regras são até bem básicas mas por vezes temos tendência a esquecê-las, e o Tiago juntou-lhes actualidade.

#target: A mais simples de todas e talvez a razão porque todos estamos a falar dele neste momento: se queremos agradar a todos não vamos marcar posição relevante. É melhor ter a populaça dividida entre adeptos ferverosos e haters, do que as pessoas gostarem todas medianamente de nós – esses não votam em nós para ganharmos festivais ou não compram sem quaisquer dúvidas o nosso produto.

#content: Outro ponto a favor do Tiago é criação de conteúdo sempre coerente com o posicionamento ou storytelling pré-definido, neste caso de “performer de arte moderna arrojada”, e que vai desde os detalhes da sua biografia oficial em que sublinha que nasceu no mesmo dia do realizador de cinema de animação Hayao Miyazaki (ou seja, 5 de janeiro) até à escolha do local para lançamento do seu mais recente disco, a Galeria Zé dos Bois.

#disrupção: A personalidade arrojada e desafiadora também é sem dúvida chamativa. O seu percurso “atrevido”em que gosta de salientar que trabalhou numa sex shop em que vendia muitos estimuladores para clitóris, as letras sexualmente explícitas proferidas de surpresa em programas diurnos e a atitude de que tudo o que é tabu ou “estranho” mas actual pode ser falado dentro de uma forma de arte, fazem parte de um embrulho consistente. Quem é da área também já deve ter reparado que a marca FILA (a quem desde já dou os parabéns pela capacidade de arriscar) veste Conan e o dançarino que o acompanha. Só esta parte é que não convém exagerar para não sairmos do registo artista para influencer de moda. Até agora foi tudo muito bem equilibrado na forma de fazer e tratar os conteúdos.

#insights: Para acabar, confesso-me fã do Conan Osíris, não tanto da música mas do marketeer/criativo/artista, e espero que alguma desta inteligência venha do facto de ter estudado art e design como muitos de nós criativos, associando-lhe uma boa observação das pessoas e da sua vida, algo que todos nós também deviamos fazer mais de forma a enriquecer o nosso trabalho e, por conseguinte, o nosso mercado.

#tendências: Quando acabo de escrever este texto recebi um Whatsapp de um amigo com a música de Conan “Quem me dera que fosses para o caralho!”. Esperem. Esta música não vos faz sentido em alturas específicas da nossa vida? Decidi ouvir as outras músicas todas outra vez. “Adoro bolos” sem dúvida um desabafo sobre um problema que não é um problema na verdade no meio dos assuntos relevantes da nossa vida como o amor, e quantas vezes os confundimos? “Eu é que sou borrego” sobre a culpa de numa relação estragada ou a famosa “ Telemóveis”, esses objectos que já são parte tão integrante das nossas vidas mais íntimas.

#resultados: Se calhar, até gosto da música de Conan. E mesmo tudo o que não faz sentido nas suas letras, sendo de propósito, não passa a fazer sentido enquanto arte propositadamente louca? Bem, uma coisa é certa, eu estou aqui a escrever sobre ele! E ficava orgulhoso que tivesse uma grande prestação no festival da canção como culminar de uma estratégia tão interessante.

Frederico Roquette, partner e creative director da 9 creative, connected, communication

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Segunda-feira, 25 Março 2019 11:23


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