Decisões baseadas apenas no “último clique” podem sabotar a sua estratégia de marketing. Nas próximas linhas, partilho uma experiência real, insights do Sparktoro, Google e Semrush, e proponho um novo olhar sobre os modelos de atribuição no marketing B2B.
Será que o seu canal favorito está a enganá-lo? E pior: será que está a fazer com que deixe de investir justamente no que funciona?
Parece exagero? Eu explico. Em tempos de dashboards, relatórios automatizados e metas agressivas, é tentador acreditar que existe um “herói da conversão”. Aquele canal mágico que gera os leads e, por isso, merece todos os créditos e orçamentos futuros.
Vamos tomar como exemplo o Google Ads. Em muito casos aparece como uma estratégia de fundo de funil que resulta e por isso costuma ser esse herói. “O lead veio de lá? Então vamos apostar mais e mais ali.”
Quando paramos para olhar dessa forma, parece bem racional o tipo de pensamento. É uma lógica baseada naquilo que conseguimos ver de forma intuitiva e clara. A questão é que essa lógica ignora uma parte crucial da jornada: o contexto.
O mito do herói da conversão ignora o contexto, ou seja, deixamos de querer saber o que está por trás daquela conversão. Vamos para um caso real.
Recentemente, avaliámos a origem de um lead que fechou um contrato connosco. No relatório, o Google Ads apareceu como o canal responsável. Tudo certo, a origem do lead está clara. Mas, ao olhar com mais atenção, vimos que a história era um pouco diferente.
Dois meses antes, a pessoa tinha feito o download um e-book técnico. Parou para ler o ebook e depois voltou ao site umas quatro ou cinco vezes ao longo das semanas seguintes. Interagiu com um post da empresa no LinkedIn. E depois começou a procura mais intensa para substituir a solução atual que tinha. Numa dessas pesquisas, clicou num anúncio no Google.
Tive a oportunidade de conversar com o lead para entender o tipo de problema que queria resolver e como nos encontraram. Ficou então mais claro o que aconteceu e como aconteceu. O Google capturou a procura, mas não a criou.
É esse o problema do último clique. Segundo o próprio Google, “a maioria dos anunciantes está acostumado a medir o sucesso com base no último clique.” Isto significa ignorar todas as interações anteriores, inclusive as que geraram valor real, construíram confiança e ajudaram a posicionar a marcar como uma das soluções para resolver aquele problema.
E aí que mora o risco. Se o relatório aponta que o Google teve um melhor desempenho, é comum que se repense investimentos no reforço da marca, conteúdo, eventos, colaborações, melhorias técnicas no website, etc.
Esses canais, menos “rastreáveis”, acabam por serem vistos como não tão eficientes. Na prática, são eles que fazem o trabalho inicial de posicionar a marca no mercado, para depois outro canal capturar a conversão.
A reflexão é que o mundo está cada vez menos linear, e isso já é notado por quase todos os que trabalham com o universo digital. A amplitude de canais de conteúdo está cada vez maior, principalmente se comparamos com 20 anos atrás. A forma como consumimos conteúdo também é cada vez mais dispersa. Porque não mudar a forma como medimos os resultados?
Existe um movimento de obsolescência dos modelos tradicionais de atribuição. Em junho de 2023, seguindo essa linha, o Google aposentou esses modelos de atribuição como “primeiro clique”, “linear” e “posição baseada”. Ainda tem a possibilidade de escolher o modelo baseado em último clique.
Quando vamos para a evolução desses modelos, podemos falar do data-driven attribution do Google. O Semrush apresenta, além dos tradicionais modelos, o W-Shaped. O mercado está a adaptar-se porque sabe que o modelo tradicional não responde a toda a complexidade atual.
Como bem destaca Rand Fishkin, da Sparktoro, “a adoção de dispositivos móveis e o domínio das suas apps ocultam ainda mais os dados de atribuição.” Já não dá para tomar decisões estratégicas com base apenas no que aparece apenas nos gráficos, precisamos investigar o que está por trás daqueles números.
O que fazer, então? Um modelo baseado em contexto. A solução está em substituir a procura pelo “campeão de conversão” por um modelo exploratório. Um olhar contínuo e analítico para saber como foi a jornada até ao momento presente. Esse modelo faz três perguntas simples e poderosas:
Onde a procura está a ser gerada? Aqui queremos conhecer a origem dos primeiros contactos, quais os canais que os leads utilizaram para descobrir a nossa marca ou a nossa solução.
Como está a ser capturada? Como se tornou um lead, se foi através de um formulário de ads, formulário do website, prospeção ativa da equipa comercial…
Onde estão os gargalos da jornada? Se estamos a perder muitos leads no meio do caminho. Detetar potenciais problemas no alinhamento da mensagem externa, na qualificação dos leads, no tempo de resposta…
A partir daí, é possível melhorar a estratégia como um todo, e não apenas premiar um canal isolado. Isto provoca a área de marketing, e faz com que o marketing B2B deixe de operar em modo automático, apenas focado em gerar leads.
A justificação é que os orçamentos estão mais disputados, os ciclos de venda mais longos e a construção de marca voltou a ganhar protagonismo. Se quer fugir da luta por menor preço, é preciso gerar e mostrar valor, e isso só acontece através da construção de diferenciais competitivos da marca.
Quem se limita ao “último clique” pode até ter bons relatórios no fim do mês, mas aos poucos perde força estratégica, perde autoridade e perde oportunidades. Antes de investir, pare para diagnosticar.
Este texto não é uma receita pronta ou a última palavra no assunto. É um convite à reflexão. Acredito num marketing mais maduro, que respeita o tempo da jornada de compra e reconhece a importância de cada ponto de contacto. Que sabe que o sucesso raramente é responsabilidade de um único canal. E que, muitas vezes, o herói da conversão nem aparece no relatório.
Se quisermos evoluir como profissionais e como mercado, é preciso repensar como, e por que, estamos a medir os resultados.
Fellipe Leal, CloudCockpit Marketing Manager da Create IT