Recuemos no tempo. Há uns bons 20 anos que Miguel e Vanda Nunes estavam à frente da marisqueira a que emprestaram o apelido. Localizada na Rua Bartolomeu Dias, entre Belém e o Restelo, foi-se tornando pequena para os que a procuravam. Quem passava deparava-se, vezes sem conta, com fila à porta, de quem esperava, pacientemente, o seu lugar, não ao sol, mas à mesa.
Foi este o cenário que levou o casal a lançar-se na demanda de um novo espaço. Miguel Nunes assume, em declarações à Briefing, que as condições existentes, em termos de cozinha e de armazenamento, mas também de balcão, para preparação do marisco, já não permitiam responder à procura.
Alimentaram, assim, a vontade de uma nova casa para a sua marisqueira, uma casa que ficasse para os próximos anos e que, ao mesmo tempo, permitisse crescer. Encontraram-na na mesma rua. Esse desejo de intemporalidade estendeu-se ao ambiente: “Queríamos uma imagem que perdurasse no tempo”, comenta, partilhando que foi a paixão da mulher pela Art Déco que fez vingar a ideia de desenhar uma marisqueira em linha com este estilo artístico: “Queríamos transmitir alegria e a Art Déco permite isso, porque tem cor, e, ao mesmo tempo, permite ter uns toques marinhos.”
E motivos marinhos não faltam, de facto. A começar pelo aquário de nove metros de comprimento que é a peça central da marisqueira e aquela em torno da qual se desenrola toda a ação. Em evidência também duas estátuas – uma de Neptuno e outra de uma sereia, peças a que não se consegue ficar indiferente num ambiente que, em tudo, evoca o fundo do mar, mas que é, igualmente, uma homenagem à pesca e aos seus artesãos.
Miguel Nunes assume que foi intencional fugir de uma marisqueira clássica, porque acredita que, cada vez mais, os clientes querem estar confortáveis, em ambientes agradáveis. A gastronomia é importante, claro, mas não é suficiente. Daí a criação de alguns recantos, que, com a ajuda de um jogo de sofás, permitem alguma privacidade na sala central. Para mais recato, há uma outra sala que pode ser convertida num espaço privado. E há a barra, outra das novidades da Nunes Real Marisqueira: mesas e bancos de pé alto convidam a um petisco: ostras, presunto, hot dog ou prego de lavagante são algumas das opções para “picar”, com espumante ou cerveja, por exemplo.
A cerveja é, claro, a rainha numa marisqueira, mas, aqui, a aposta no serviço de vinhos é assumida, com as sugestões a cargo do sommelier Gabriel Duarte. É ele que harmoniza a refeição que provámos.
Para começar, algo simples, ou talvez não: pan tomaca, que o mesmo é dizer, pão torrado com tomate, a acompanhar umas fatias finíssimas (e muito gulosas) de presunto ibérico. Logo, logo entrámos no marisco: camarão alistado com caviar. Mais fresco não podia ser (e não porque vinha empratado em gelo…), com a carne branca no ponto certo de cozedura. A propósito de frescura, não há como falhar uma boa dose de perceves, com aquele sabor inconfundível a mar.
Estava preparado o apetite para aquele que viria a ser o ato principal desta experiência: o spaghettoni de lavagante. Bastaria olhar para se ficar de água na boca, mas, havia que provar, claro. E indulgência é a palavra que melhor descreve este que é um dos pratos mais recentes da carta.
Não é, porém, a estrela da companhia, digamos assim, porque a lagosta à basca é o prato mais emblemático. Mas, faz parte da nova geração de propostas, que o casal Nunes vai introduzindo, não obstante o desejo de manter o conceito da marisqueira. Afinal, há toda uma nova clientela – entre portugueses e turistas – que tem vindo a descobrir a Nunes nesta sua nova existência.
O propósito – diz Miguel Nunes – é manter a qualidade do peixe e do marisco. Mas, a dimensão da cozinha já permite incursão por outras técnicas gastronómicas. E planos para crescer? Talvez, mas, para já, o tempo é de consolidar a operação neste espaço que abriu há um ano.
Fátima de Sousa