A Black Friday tornou-se num dos maiores eventos comerciais do ano, sinónimo de uma forte dinâmica promocional e de um aumento significativo da atividade de consumo. Por trás das longas filas, das compras por impulso e das campanhas relâmpago, escondem-se impactos consideráveis no ambiente e na sociedade. Assim, à medida que as empresas reforçam os seus compromissos ESG e que os consumidores se tornam mais exigentes quanto à sustentabilidade, surge um novo paradigma: transformar a Black Friday numa Green Friday, um momento de reflexão e responsabilidade.
A pegada da Black Friday
A lógica da Black Friday baseia-se no aumento exponencial do consumo. Esta dinâmica tem custos ambientais elevados – desde a intensificação da produção até à logística acelerada para garantir entregas em tempo recorde. O resultado é um aumento considerável das emissões de CO₂, do uso de embalagens descartáveis e do desperdício de produtos, especialmente em setores como a moda e a tecnologia.
O impacto da Black Friday vai além do comércio, refletindo-se também em desafios operacionais e na necessidade de encontrar um equilíbrio entre promoções e práticas mais responsáveis.
Da Black à Green: Redefinir o consumo
A Green Friday surge como uma resposta a este modelo, convidando empresas e consumidores a repensarem o valor do consumo. O objetivo não é eliminar as promoções, mas redefinir o seu propósito, colocando a sustentabilidade no centro da estratégia comercial.
Cada vez mais marcas aderem a esta tendência, oferecendo descontos em produtos sustentáveis, campanhas de sensibilização ambiental e ações solidárias, como a doação de parte das receitas a causas sociais ou ambientais.
Este movimento traduz uma nova mentalidade: gerar valor e vender mais e melhor a longo prazo, com produtos duráveis, éticos, com menos impacto ambiental e menor pegada ecológica.
O papel das marcas: Coerência e compromisso
Para as marcas, a Green Friday representa uma oportunidade de reforçar a autenticidade das suas estratégias de sustentabilidade. Algumas práticas fundamentais incluem:
– Promover transparência nas comunicações, garantindo que as campanhas não configuram greenwashing;
– Reduzir o impacto da produção, mantendo os compromissos de eficiência energética e redução de emissões, mesmo em períodos de alta procura;
– Incentivar a economia circular, oferecendo serviços de reparação e programas de retoma ou de reciclagem de produtos antigos;
– Recompensar o consumo consciente, através de programas de fidelização que valorizem escolhas sustentáveis;
– Investir em educação ambiental, usando o poder da comunicação para sensibilizar clientes e colaboradores sobre práticas responsáveis, e promover o compromisso dos cidadãos com a reciclagem.
Uma Green Friday bem estruturada não é apenas uma campanha de marketing, é uma demonstração de valores. Mostra que a empresa não está apenas interessada em vender, mas também em gerar impacto positivo e duradouro.
Consumo sustentável: Pequenas ações com grande impacto
Enquanto as marcas reavaliam as suas práticas, os consumidores também desempenham um papel essencial nesta mudança. O consumo sustentável começa com decisões mais conscientes. Algumas dicas práticas incluem:
- Planeie antes de comprar – avalie se realmente precisa do produto ou se a compra é apenas motivada pelo desconto;
- Prefira qualidade à quantidade – um produto durável compensa mais do que várias versões descartáveis;
- Valorize marcas comprometidas com práticas éticas e transparentes;
- Reduza, reutilize e recicle – opte por reparar, trocar ou doar antes de substituir;
- Desconfie do “verde fácil” – nem todas as campanhas sustentáveis o são de facto, procure informações sobre certificações e compromissos reais.
Estas atitudes, quando adotadas em escala, ajudam a criar uma cultura de consumo responsável, reforçando o impacto positivo das iniciativas corporativas.
Reutilizar, reparar e reciclar: O ciclo virtuoso do consumo
O futuro do consumo sustentável depende da transição para uma economia circular, em que os recursos são mantidos em uso o máximo de tempo possível. A reutilização e a reciclagem devem ser vistas não como opções de último recurso, mas como estratégias prioritárias.
Empresas podem liderar esse movimento oferecendo programas de recolha de produtos usados, serviços de reparação, parcerias com projetos de reaproveitamento de materiais e, especialmente, implementando iniciativas que promovam a reciclagem de embalagens e outros resíduos após o consumo/compra. Incentivar a que os cidadãos reciclem deve fazer parte da estratégia das marcas, garantindo que os produtos tenham um ciclo de vida mais sustentável, promovendo, assim, uma economia cada vez mais circular. Já os consumidores podem contribuir de forma ativa, separando corretamente os resíduos, reutilizando materiais sempre que possível e optando por soluções em segunda mão, ajudando a fechar o ciclo da economia circular.
Da oportunidade comercial ao compromisso sustentável
Transformar a Black Friday numa Green Friday é um passo essencial para alinharmos o consumo com os valores da sustentabilidade. Para as empresas, representa uma oportunidade de se diferenciarem através da coerência e do impacto positivo. Para os consumidores, é um convite à reflexão sobre o verdadeiro valor das suas escolhas.
No fim, a questão não é deixar de consumir, mas consumir melhor. Porque o verdadeiro desconto é aquele que reduz o custo ambiental e social do nosso modo de vida.
Ana Trigo Morais, CEO da Sociedade Ponto Verde e vogal da direção do GRACE – Empresas Responsáveis

