2050.Briefing | O que justifica a existência da Semana Mundial da Água?
Gabriela Suhoschi | A Semana Mundial da Água é organizada pelo SIWI há 30 anos e tem vindo a crescer, de ano para ano. Começou com pouco mais de 200 participantes e na última edição 13 mil pessoas de todo o mundo ligaram-se a nós.
O nosso principal objetivo é organizar uma conferência para os agentes de mudança, porque queremos a ver a ação a acontecer. Juntamos cientistas, políticos, instituições financeiras… há uma grande diversidade entre os participantes. E quando se congrega esta diversidade, seja profissional, seja regional. Tem-se uma grande hipótese de se conseguir lidar com os desafios.
A Semana Mundial da Água é um evento importante, não só para a comunidade da água, mas também para o mundo. Porque podemos desafiar o processo de decisão política. É por isso que propomos programas em que encorajamos as mulheres a participar, outros em que envolvemos os jovens. Queremos amplificar a voz destes grupos.
Desde a primeira conferência, que evolução identifica na sensibilização para os temas da água?
Estou no SIWI há dez anos, mas temos participantes que nos acompanhamos desde o princípio. E parece que estamos a falar sempre dos mesmos assuntos, mas as perspetivas são diferentes. Neste momento, estamos a mergulhar no verdadeiro problema, porque falamos de igualdade de género, de redução da pobreza, da água como meio para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Fizemos um grande progresso no que toca à água, que está agora na agenda dos políticos, dos investidores privados, das instituições financeiras. É uma grande conquista.
Mencionou as diferentes perspetivas de olhar a água. A que se refere?
Hoje em dia, temos melhores ferramentas para abordar a água de diferentes perspetivas. A questão de haver regiões que ainda não têm acesso a água potável, embora tenhamos feito progressos e o mundo pareça muito melhor. Mas, ainda há muito para fazer. Temos, por exemplo, os desastres naturais, que ameaçam o mundo, em geral, e algumas comunidades especificas. Enfrentamos novos desafios, porque o mundo está a mudar. E temos de estar mais bem preparados.
É possível identificar os principais desafios?
Penso que temos três grandes problemas com a água, em geral, embora difira de região para região: há lugares que não têm água suficiente, isto é, que sofrem os efeitos da seca; outros onde a água é suja, inquinada; e outros ainda onde há demasiada água, ou seja, são vítimas de inundações.
E, no meio, colocam-se as questões da higiene e da igualdade de género – há regiões em que as mulheres e as crianças carregar a água de longas distâncias, não se sentem seguras, faltam à escola… Há muitos assuntos subjacentes, muitas camadas.
É por isso que o tema deste ano é “Ver o invisível. O valor da água”?
Todos os anos, o SIWI escolhe olhar para o problema da água com uma lente diferente. Este ano desafiamos a comunidade a olhar para o valor da água. Precisamos compreender qual é o real valor da água para as pessoas, para o ambiente. Temos de olhar para o que não se vê – esta é a chave para resolver a crise da água. E o que não se vê é a água que está escondida nos aquíferos e na atmosfera, mas também os problemas sociais – a desigualdade de género, por exemplo, é invisível, tal como a fome e a pobreza.
O problema vai muito para além do ambiente, é preciso ver a água invisível e fazer investimentos.
E a conferência tem o potencial de divulgar, de chamar a atenção para valores e atitudes de que não falamos muito, de que não temos muita consciência. É uma abordagem da água do ponto de vista dos direitos humanos. Queremos compreender e promover uma mudança de comportamentos que, no limite, resulte em decisões mais inclusivas.
Mencionou os ODS. Qual a relevância da água neste contexto?
A água é muito mais do que os dois ODS específicos – o 6, relativo a água limpa e saneamento, e o 14, sobre a vida debaixo de água.
Se olhar para os ODS, a água é o denominador comum. E é importante valorizar adequadamente a água quando se trata do desenvolvimento sustentável. Dou-lhe um exemplo: quando se fala de energia acessível e limpa [ODS 7], isso exige água; tem de se minimizar a poluição, mas também tem de se reduzir o consumo.
Estamos convencidos de que a água é um tópico cada vez mais importante. Aliás, sem nos focarmos na água, não tenho a certeza se vamos conseguir cumprir os objetivos.
A conferência propõe-se convocar os agentes de mudança com vista à ação. Tem havido suficiente ação no que toca à água?
Com a seca, as mensagens têm sido no sentido de reduzir o consumo, porque não é um recurso infinito. Não falamos o suficiente sobre isso, não o sentimos, a não ser quando a água falta, quando deixa de correr nas nossas torneiras. E, provavelmente, vai acontecer mais vezes, pelo que temos de estar mais bem preparados e criar maior consciência no modo como nos relacionados com a água.
Tem de haver um esforço colaborativo, temos de falar uns com os outros. Não colaboramos o suficiente. Há soluções, só precisamos de as deixar ganhar escala.
Há muita paixão no que toca a resolver os problemas, o que é muito contagioso, mas tem de haver mais colaboração entre setores e soluções mais concretas, menos conversa e mais ação.