O planeta está em rutura. Quatro das nove fronteiras essenciais à vida humana na Terra estão para lá da linha vermelha há muito tempo, com as alterações climáticas cada vez mais no topo das preocupações. Os últimos sete anos foram os mais quentes alguma vez registados. As concentrações de gases com efeito de estufa, o aumento do nível do mar, a temperatura e a acidificação dos oceanos voltaram a atingir novos recordes em 2021, de acordo com o mais recente Relatório do Estado do Clima da Organização Meteorológica Mundial (OMM), divulgado pelas Nações Unidas em abril deste ano.
A transição para um modelo de desenvolvimento sustentável, assente em princípios ambientais, sociais e de governança justa e transparente (ESG), é urgente para restabelecer o equilíbrio do nosso ecossistema, que, com quase 8 milhões de pessoas a precisar dele como fonte de energia, vida e alimentos, e uns quantos séculos de uma lógica de recursos naturais inesgotáveis, se encontra em perigo.
A segunda edição do relatório Global Land Outlook (GLO), da Convenção de Combate à Desertificação das Nações Unidas (UNCCD) relembra que a ação do ser humano conseguiu já alterar mais de 70% da área terrestre da Terra do seu estado natural. Resultado? Uma degradação ambiental que contribui significativamente para o aquecimento global e que coloca em causa 44 biliões de dólares, superior a metade do PIB anual global, direta ou moderadamente dependentes deste capital natural.
Do futuro que era dado como adquirido há algumas décadas, passou-se para um tempo onde nos questionamos sobre o amanhã que vamos construir para garantirmos a sobrevivência, em 2050, de cerca de 10 mil milhões de pessoas no planeta, sem eliminar, entre outras coisas, a biodiversidade na Terra.
Uma coisa sabemos, continuar no “business as usual não é um caminho viável para a sobrevivência e prosperidade”. Os alertas neste sentido têm sido muitos ao longo das últimas décadas e é o que a análise de cenários científicos feita para 2050 e apresentada neste Global Land Outlook volta a evidenciar, demonstrando que a rota precisa de alterar o sentido rumo a uma economia regenerativa (baseada na restauração e redução da degradação da terra, das emissões de gases com efeito de estufa e da perda de biodiversidade). Uma aposta que poderá dar origem a ganhos na ordem dos 125 a 140 triliões de dólares por ano – até 50% mais do que os 93 triliões de dólares do PIB global em 2021.
Agora é o tempo de coletivamente empenharmos esforços, competências e conhecimentos para dar a volta de 180 graus necessária se queremos garantir o futuro comum. “Nunca como antes tivemos tanta consciência do que estamos a fazer ao planeta e nunca como antes tivemos tanto poder para fazer algo”, recorrendo às palavras de Sir David Attenborough, referência incontornável no mundo da comunicação e da defesa pela natureza que dispensa apresentações.
Chegámos à era das inevitáveis transições. Transição verde, digital, justa e inclusiva. E “a transformação das energias renováveis pode ser o projeto de paz do século 21”, diz-nos o Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres.
Uma volta de 180 graus altamente desafiante? Sem dúvida. É por isso que todos os atores da sociedade, dos estados, às empresas até aos indivíduos, e disciplinas do conhecimento – inclusive a comunicação – são chamados a à equação que temos como uma única hipótese para dar lugar a cenários mais positivos.
A era é de transições. 2050 é a meta em mente.
Empresas a impulsionar as mudanças
Em 2003, John Mickletwaith e Adrian Wooldridge lançaram “A Empresa: breve história de uma ideia revolucionária”, em que se descreve o papel que as empresas tiveram na criação de prosperidade, riqueza e desenvolvimento e quais os seus desafios para o novo século. Vinte anos depois da publicação deste livro, escrito por reconhecidos jornalistas na área da Economia – ambos foram jornalistas e editores na revista The Economist -, as empresas continuam a ser um baluarte de experiências, criação de riqueza e conhecimento e estão a assumir-se como principais protagonistas da “keyword” mais relevante dos nossos tempos: a sustentabilidade.
Das “green bonds” às embalagens, das baterias de lítio aos carros elétricos, dos fundos de investimento que privilegiam as empresas da “economia verde” à reconversão de indústrias outrora poluentes, a dinâmica das empresas é indispensável para o sucesso da era das transições. A sustentabilidade implica uma visão global de toda a cadeia de valor e um compromisso que envolve produtores, fornecedores e distribuidores. Trata-se de uma tarefa coletiva que pretende valorizar recursos, promover a reutilização, evitar o desperdício alimentar, dinamizar a economia circular e obriga a uma procura constante de inovação.
A sustentabilidade e os serviços necessários para responder às suas exigências contribuirão para criar novas empresas e negócios. O último ranking do Financial Times sobre as empresas que mais crescem na Europa, publicado em março, é um bom exemplo desta evolução. A lista era liderada pela finlandesa Swappie, que recupera e revende telemóveis, seguida da Kilo Health, da Lituânia, uma empresa digital de saúde e bem-estar.
As práticas ESG (environmental, social, governance) estão cada vez mais a ganhar terreno e envolvem um compromisso entre todos os stakeholders. Num artigo publicado em junho do ano passado a McKinsey refere que o investimento em ESG chega hoje aos 20 biliões de dólares, dez vezes mais do que em 2004 e uma subida de 68% em relação a 2014. De acordo com o artigo, esta evolução tem sido estimulada por um lado pela atenção que governos e consumidores estão a dar ao impacto da atividade das empresas e, por outro, pelo facto de “investidores e executivos perceberem que uma proposta de ESG mais sólida pode ajudar a garantir o sucesso da empresa no longo prazo”.
Paris e Glasgow reforçaram os sinais de alerta para as consequências das alterações climáticas. Os resultados da 17ª edição do Global Risks Report, desenvolvido pelo Fórum Económico Mundial, com a colaboração da Marsh McLennan, SK Group e Zurich e divulgado em janeiro deste ano, confirmam que o clima é a preocupação número um dos decisores. De acordo com o relatório os riscos climáticos dominam as preocupações a nível global.
Europa 2050: rumo à neutralidade climática
No final de 2019, a União Europeu deu um passo à frente e mostrou o caminho. Em dezembro desse ano e em linha com a Agenda 2030, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, apresentava o Pacto Ecológico Europeu, um verdadeiro “roadmap” para posicionar a Europa na liderança do combate às alterações climáticas.
Segundo a Comissão Europeia, o Pacto estabelece um conjunto de propostas legislativas com o objetivo de tornar as políticas da UE em matéria de clima, energia, transportes e fiscalidade aptas para alcançar uma redução das emissões líquidas de gases com efeito de estufa de, pelo menos, 55 % até 2030, em comparação com os níveis de 1990, rumo ao impacto neutro no clima até 2050. Será financiado por um terço dos 1,8 biliões de euros de investimentos do Plano de Recuperação do NextGenerationEU e pelo orçamento da UE para sete anos.
Portugal e a transição climática
A transição climática é uma das dimensões do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) atualmente em execução. De acordo com o site do PRR, “na dimensão de Transição Climática foram consideradas 6 Componentes com intervenção em áreas estratégicas, como sejam o mar, a mobilidade sustentável, a descarbonização da indústria, a bioeconomia, a eficiência energética em edifícios e as energias renováveis”.
Em 2019, ainda antes da pandemia, o governo português entregou nas Nações Unidas a sua proposta de Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050. A trajetória definida pelo Executivo da altura passava pela redução de emissões de gases com efeito de estufa entre 85% e 90% até 2050 e a compensação das restantes emissões através do uso do solo e florestas, a alcançar através de uma trajetória de redução de emissões entre 45% e 55% até 2030, e entre 65% e 75% até 2040, em relação a 2005.
Europa 2050: rumo à neutralidade climática
No final de 2019, a União Europeu deu um passo à frente e mostrou o caminho. Em dezembro desse ano e em linha com a Agenda 2030, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, apresentava o Pacto Ecológico Europeu, um verdadeiro “roadmap” para posicionar a Europa na liderança do combate às alterações climáticas. O Pacto estabelece um conjunto de propostas legislativas com o objetivo de tornar as políticas da UE em matéria de clima, energia, transportes e fiscalidade aptas para alcançar uma redução das emissões líquidas de gases com efeito de estufa de, pelo menos, 55 % até 2030, em comparação com os níveis de 1990, rumo ao impacto neutro no clima até 2050. Será financiado por um terço dos 1,8 biliões de euros de investimentos do Plano de Recuperação do NextGenerationEU e pelo orçamento da UE para sete anos.
O papel da comunicação
Mobilizar pessoas, instituições e governos em torno de temas muitas vezes complexos é um desafio. A comunicação emerge assim, como nunca antes, como ferramenta essencial para sensibilizar e levar à transição e alteração de comportamentos individuais e coletivos que nos coloquem num cenário mais positivo em 2050.
Comunicar a sustentabilidade assume-se, cada vez mais, como um imperativo para as organizações. Os consumidores estão mais atentos e exigentes, e dar a conhecer o que se faz no sentido da criação de valor económico, social e económico, é sinónimo de construção de reputação e, a longo prazo, de sobrevivência das organizações. Os stakeholders precisam desta informação, seja do ponto de vista dos acionistas ou mesmo dos colaboradores.
Se dúvidas houvesse, a pandemia global que assolou o mundo em 2020, veio dissipá-las. O mundo mudou. Os consumidores mudaram. E as organizações acompanham esta mudança, que resulta no emergir de uma maior consciência ambiental e social no seio de uma sociedade mais ativista e menos permeável à ausência de transparência.
Este imperativo traz consigo desafios. Partindo de um lugar em que as práticas de responsabilidade social e corporativa não eram comunicadas, ou sendo-o resvalam no sentimento agridoce de compensação por comportamentos menos éticos, para um lugar de urgência onde todos passam a querer comunicar tudo, a dificuldade em criar mensagens simples, claras, diferenciadoras, atrativas e eficazes na sensibilização para assuntos complexos, é grande.
Há já muito tempo que a criatividade é um instrumento poderoso na comunicação, desde os primórdios das primeiras campanhas de publicidade. Agora, a sua aplicação é requerida no que à comunicação da sustentabilidade diz respeito, revelando-se, uma vez mais, como um poderoso aliado no apoio à mudança comportamental.
The Lion’s Share: criatividade e transparência
A ideia que está por trás da criação do Fundo Lion’s Share é um maravilhoso exemplo de comunicação e criatividade. A iniciativa, liderada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), pede às marcas que usam animais nos seus anúncios que doem 0,5% do que gastam em publicidade para a conservação da vida selvagem e do bem-estar animal.
Uma aliança poderosa que une a criatividade do mundo da publicidade e das produtoras, à credibilidade de um embaixador único, o incomparável Sir David Attenborough, para passar uma mensagem necessária e poderosa, apelando à responsabilidade e envolvimento das marcas que usam o talento animal para obter lucro, seja na sua identidade corporativa, seja nos seus anúncios. Dirigida ao mundo corporativo esta campanha acaba por fazer eco em cada um de nós, na sociedade no seu todo.
A campanha de lançamento do Fundo Lion’s Share foi galardoada, em 2019, no Lions Festival de Cannes com o Grande Prémio e reconhecida na categoria Objetivos de Desenvolvimento Sustentável pelo uso da criatividade para ajudar a enfrentar um dos maiores desafios ambientais do mundo. Também nos D&AD Awards, os prémios de maior prestígio do mundo por excelência criativa em design e publicidade, recebeu o Lápis Branco, categoria de iniciativa de impacto no Meio Ambiente e Sustentabilidade.
Até hoje o Fundo Lion’s Share continua o seu trabalho e é possível saber para onde está a ser encaminhado o valor angariado, através do site do PNUD, onde conseguimos ver as empresas que doaram ou os projetos nos quais foi investido esse valor, fomentando desta forma a confiança entre stakeholders através de processos transparentes que revelam os resultados conseguidos, a mudança alcançada.