A situação não é tão dramática no caso português. A dependência de Portugal do gás natural fornecido pela Rússia não excedeu os 10% em 2021. Mas na Alemanha, por exemplo, a dependência do gás russo ronda os 55% e, por isso, Berlim já negociou o fornecimento de gás natural liquefeito com o Qatar.
Se há algum ensinamento que esta guerra veio deixar-nos é o de que vale a pena apostar em força nos recursos energéticos endógenos que abundam em cada país, nomeadamente o vento, o sol e a água, usando cada vez menos o gás natural, seja para produzir eletricidade ou como combustível, embora o gás natural seja a ainda necessário para assegurar o equilíbrio entre oferta e procura no mercado de eletricidade.
Paralelamente, importa acelerar a produção de hidrogénio verde (H2) e apostar no armazenamento de eletricidade com hídrica de bombagem, baterias e hidrogénio verde. Isso permitirá assegurar a independência energética e, consequentemente, a segurança de abastecimento de energia, acautelando situações como a que estamos hoje a viver.
A guerra veio lembrar-nos também de que é necessário diversificar geograficamente e politicamente os fornecedores de produtos energéticos, de modo a evitar cair novamente na armadilha da dependência excessiva de um único país.
Apostar nas renováveis permite ainda garantir eletricidade a custos mais baixos para as famílias e para as empresas. Apostar nas renováveis é apostar num modelo de sustentabilidade que defende o cidadão, mas também o tecido empresarial.
Ter uma visão global não deve impedir-nos de agir localmente. A eletricidade pode ser um caso paradigmático a este nível. Até porque há também soluções nas quais a produção e o consumo estão no mesmo espaço como alternativa à produção em grandes centrais ligadas à rede pública.
Esta estratégia é compatível com o aumento de capacidade das interligações elétricas e de gás natural que permitam o fluir da energia no espaço europeu concorrendo para um verdadeiro mercado único. A Península Ibérica ainda continua a funcionar como uma ilha em termos energéticos e esta é uma das mudanças que pode agora vir a ser implementada, sendo que o espaço ibérico apresenta uma trajetória de redução dos custos de energia renovável quando comparado com outras regiões europeias.
Como forma de conter a escalada dos preços da energia, em consequência desta guerra, foi anunciado pelo Governo um conjunto de medidas que incluem a simplificação dos procedimentos de licenciamento e autorização para produção de eletricidade a partir de fontes renováveis. As medidas de emergência, na área do ambiente e ação climática, conhecidas a 11 de abril, preveem, por exemplo, a injeção na rede de toda a produção de centros electroprodutores eólicos existentes sem limitações administrativas, de modo a aproveitar toda a produção possível.
A aposta nas renováveis é uma estratégia com benefícios ambientais, económicos e sociais. A guerra veio mostrar que esta é também a opção mais segura enquanto garante de soberania, independência e progressiva autonomia energética, garantindo a segurança de abastecimento.