Depois de décadas em que exaurimos os recursos naturais como se não houvesse amanhã, em que produzimos e consumimos sem qualquer preocupação com o impacto que tínhamos no mundo, eis que, subitamente, empresas que ontem confundiam a sustentabilidade com mero greenwashing têm agora preocupações com o impacto das suas cadeias de abastecimento. O que mudou?
Dos grandes retalhistas às empresas extractoras, está na ordem do dia a preocupação em garantir a redução do impacto ambiental e uma mais eficiente utilização de recursos ao longo da cadeia de valor. Em muitos casos, a sustentabilidade é mesmo um pilar da estratégia corporativa e, se nas suas opções na gestão da cadeia de abastecimento uma empresa que procura ser mais sustentável o faz (também) para assegurar as prioridades competitivas que identificou, torna-se claro o papel que os clientes têm como driver do esforço. Porém, com frequência, já não está em causa uma mera reacção à pressão do consumidor. Mesmo se esta pressão se traduz quer em acções mais exuberantes, como o protesto numa loja Co-op em Londres contra a venda de “Frankenchickens” por aquele grande retalhista, ou no mais discreto, mas potencialmente mais impactante protesto manifestado na decisão de (não) compra. É certo que a procura do cliente é um driver relevante deste esforço da empresa, tal como o é a legislação ou os requisitos imperativos dos seus clientes, que estes divulgam nos seus sites institucionais. Porém, talvez se possa acreditar que este foco no consumidor – porventura mais determinante no caso do greenwashing – não seja já o principal driver da sustentabilidade das cadeias de abastecimento. O que mudou?
O consumidor, o tal que nos dizem ser mais informado, é, ou melhor, somos (e uns mais do que outros, claro) um poço de contradições, tão preocupados com a sustentabilidade como movidos pelo nosso hedonismo consumista, mais do que nunca. Mais do que ser vítimas da obsolescência programada de que nos queixamos, estamos viciados nela e, no fundo, as marcas de que nos queixamos só nos dão um pretexto para fazer o que queremos: comprar novo. Apontamos o dedo à fast fashion, mas compramos ao ultra fast fashion peças que vestimos uma só vez. As empresas talvez também continuassem, como parece sempre terem feito, a gerir as suas cadeias de abastecimento com a mesma lógica de curto prazo… se a realidade as deixasse. Acontece, porém, que os problemas que procuram agora evitar deixaram de ser problemas de longo ou médio prazo e tornaram-se um drama no curto prazo e os esforços de sustentabilidade das empresas mais não são do que luta pela sobrevivência. Contudo, por muito que se esteja a fazer, desde a recuperação de materiais, ao combate ao desperdício na cadeia de valor, à aposta nas energias renováveis, à redução do impacto ambiental do transporte, infelizmente, esta luta lembra os versos finais de uma velha música dos Marillion: “Clutching at straws, We’re still drowning, Clutching at straws”.
Marco Pimpão, Lecturer na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda – Universidade de Aveiro